“Vida de Jesus”, cuja primeira edição é do século XIX (1863), de Ernest Renan, é um dos livros mais ousados e inteligentes já escritos. Tem o rigor científico de um historiador, um leitor minucioso da história de Jesus conforme nos é contada na Bíblia. Renan disseca a figura de Cristo não na tentativa de fazer ruir o mito, mas, sim, de estudá-lo com um olhar científico, tentando deixar de lado ilusões individuais ou coletivas.
Se lido com a mente aberta, perceber-se-á que se trata de uma obra que não teve a intenção de ser blasfematória. Não há ranço, não há crítica aos que, pela fé, coadunam com o que a Bíblia narra, crendo, por exemplo, que houve milagres — Renan descarta, dentre outras coisas que são contadas nos Evangelhos, a existência de milagres.
Não se trata de um livro contra Jesus nem contra a história do cristianismo. Sem radicalismos, Renan expõe pensamentos e conclusões sem o tom de quem pretende causar polêmica. É fácil polemizar e chocar. Renan não é iconoclasta; é “apenas” um historiador que olha para a figura de Cristo e tenta lançar sobre ele e sua época, com rigor e sensatez, um olhar racional, rigoroso e bonito.
Nos tempos atuais, em que, na falta de bons argumentos, as pessoas têm vociferado desatinos travestidos de opiniões, “Vida de Jesus” acaba sendo, de quebra, uma aula de retórica e de bom senso. A obra ensina, mesmo não sendo sua intenção principal, que até algo muito polêmico pode ser tratado com inteligência.
A edição que tenho é da Martin Claret, que na década de 80 fez sucesso com a coleção O pensamento vivo, na qual grandes inteligências eram biografadas. A tradução de “Vida de Jesus” é de Eliana Maria de A. Martins. Errinhos de digitação aqui e ali não chegam a comprometer a edição, que tem breve cronologia da vida de Renan e, seguindo o perfil didático da editora, apêndices.
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