sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

QUESTIONAMENTO

Lucas tem um ano e meio de pura travessura. Está dentro de um carro, que passa em frente ao hospital em que o garoto nasceu. Serelepe, ele aponta o dedo para o hospital e diz:

— Foi aqui que eu saí de dentro da barriga da minha mãe.

Lucas dá uma risada; segundos depois, abandona subitamente a gargalhada, faz cara de incompreensão e pergunta:

— Uai, mas como é que eu entrei na barriga da minha mãe?! 

BICUDO


Sempre que me deparo com algo de que não sei o nome, eu me lembro do Arnaldo Antunes: "Como é que chama o nome disso"?

P.S.: o Alexandre, um amigo, disse-me que o nome é curicaca.

NO CHÃO

Cair não é bom.
Bom é levantar-se.
Melhor seria não cair.
O chão perto da cara.
Eu olho para cima.
Há espaço no céu.
Hora de me levantar. 

FLORES NO CÉU

quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

SINTONIA FINA

Pessoas, estou no ar com o Sintonia Fina, programa musical, até às 19h. Para escutar, cliquem aqui. Conto com a audiência de vocês. 

ENQUANTO ISSO...


No fim de tarde de terça-feira, dia 18 de fevereiro, levei um tombo de moto, do qual ainda estou me recuperando. Machuquei o lado direito de meu corpo  braço, mão, joelho e pé. Este ainda me preocupa, apesar dos cuidados e das visitas a médico.

Saindo de casa só para ir a hospital, o jeito é me virar com o que ocorre aqui para que eu fotografe. Foi com esse espírito que pude fotografar esta rolinha (?), que momentos antes estava na companhia de outra rolinha; cheguei a fotografar o casal.

Embora eu esteja usando muletas para me locomover pela casa, estou pensando em fazer algumas fotos por aqui, numa espécie de ensaio que teria a intenção de ilustrar ideia de que sou partidário: a de que não é preciso ir longe para fotografar. Caso tal ensaio seja feito, eu o postarei aqui. 

terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

LIZZIE VELASQUEZ

Ela é linda.

(Caso seja preciso ativar as legendas, ative-as no canto inferior direito.)

DESCRIÇÃO

Tu sabes te tornar inesquecível.
Não te esforças, não premeditas, não tentas.
Simplesmente és, em elegância sem afetação.
Caminhas leve, há um quê de etéreo
neste teu encanto que é concreto. 

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

OS DOIS


Ontem à tarde, quando fui à cozinha tomar água, vi esses dois pela janela; também me viram, mas não pareceram se importar comigo nem com minha sede. Foi então que pensei na possibilidade de fotografá-los.

Saí da cozinha de fininho com a intenção de não espantar o casal. Chegando à sala, eu não estava conseguindo achar nem a câmera nem a lente, por causa de minha desorganização. Fuçando com mais furor, eu as achei.

Voltei à cozinha como quem não quer nada, posicionando-me próximo ao local em que eu estivera há instantes, enquanto tomava água. O casal continuava no mesmo lugar. Cooperaram muito para a seção: pude fazer dezesseis fotos deles.

domingo, 23 de fevereiro de 2014

INDIVIDUAL E COLETIVO

A política, em teoria, é uma solução coletiva. A filosofia, em teoria, é uma solução individual. Parece-me que apenas uma dessas possíveis soluções não basta. Um homem sereno terá mais dificuldade em manter a serenidade em meio ao caos; um ambiente favorável parece-me inútil se é feito por pessoas infelizes.

Não creio numa hierarquia. Não penso que seja necessário haver primeiro uma solução individual para depois se buscar uma coletiva ou vice-versa. Uma solução pode levar à outra. Vejo como exercício infrutífero ficar se perguntando se o estado ruim das coisas se deve a uma falta de uma política melhor ou se ao fato de a sociedade ser composta por indivíduos doentes.

Todas as pessoas da Terra poderiam ser vistas como um só organismo, um só todo, mas esse todo é feito por individualidades. Concebo um intercâmbio ideal em que o todo e o indivíduo realizariam permutas criativas e saudáveis. Mas bem sabemos que o todo, tal como está, é feito de políticas cruéis e de indivíduos sem interesse em benefícios filosóficos. 

NATURALMENTE

Ao contemplar a foto de um soberbo pôr do sol ou ao observar a imagem de um majestoso tucano, é comum as pessoas comentarem que a natureza é perfeita. Contudo, geralmente não dizem o mesmo quando estão diante da imagem de um gavião devorando sua presa.

O modo como o homem se refere à natureza é “egoísta”, no sentido de que ele se vale de termos... humanos para se referir a coisas que não são humanas — mas que nem por isso deixam de pertencer à natureza.

Uma cachoeira pode ser adjetivada como perfeita; em contrapartida, não imagino a foto de uma inundação nas ruas de uma cidade receber tal adjetivo. Ainda assim, tanto as águas da cachoeira quanto as da inundação são manifestações da natureza.

Poder-se-ia argumentar que as tragédias naturais que destroem o homem são, no fundo, causadas por nós, que estaríamos tratando mal a natureza. Se por um lado estamos mesmo tratando-a mal, por outro, não podemos nos esquecer de que séculos antes da Revolução Industrial a natureza já matava o homem.

Para alguns, pode ser desconfortável a assunção de que a natureza não se importa com o destino humano. Não somos preservados por ela, não contamos com suas benesses nem com sua proteção. Somos simplesmente mais uma manifestação natural. Somos também natureza, mas não somos os eleitos dela. A natureza não se importa conosco; a natureza não tem eleitos.

Assim como um bem-te-vi devora o inseto, um leão vai nos devorar se estiver com fome. Esse hipotético leão não levará em conta se a presa humana era um exemplar pai de família ou se tratava-se de um assassino de gente. Se amanhã um corpo vindo do céu se chocar contra a Terra, a natureza não levará em conta o gênero humano ter produzido algo como “O leopardo”.

Parece-me haver algo de senso estético quando alguém diz, ao contemplar um luar, que a natureza é perfeita; o conceito estético é humano. Se, ao ver foto de uma ave que parece acariciar outra, alguém diz que a natureza é terna, é preciso ter em mente que ternura é nome dado pelo homem, é conceito humano.

A natureza quer ser. A natureza é. Na natureza, para que um seja, outro, às vezes, tem de deixar de ser. Há momentos em que esse outro pode ser um de nós. A natureza é mutável. Quando o Sol explodir, ele não levará em conta que em torno dele navegava um planeta que chamamos de Terra. 

RELÓGIO 7

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

CÍRCULO

Ler me deixa 
com vontade de escrever, 
que me deixa com vontade de ler.

Escrever me deixa 
com vontade de ler, 
que me deixa com vontade de escrever.

Círculo precioso 
que me deixa com vontade de viver. 

QUEDA

Dor. 
Substantivo ubíquo, atemporal.
Sintoma marcante: torna insuportável o agora. 

O QUE ME RESTA

Se um dia quiseres perder tempo, fica comigo.
Se um dia quiseres ser feliz, fica comigo.
Para ti eu tenho horas.
Para ti eu tenho toda a vida.

Se um dia quiseres meu corpo, fica comigo.
Se um dia quiseres minha alma, fica comigo.
Para ti eu tenho mãos.
Para ti eu tenho todo o corpo.

Se um dia quiseres dedicatórias, fica comigo.
Se um dia quiseres flores, fica comigo.
Para ti eu tenho versos.
Para ti eu tenho todo o livro. 

VELHA ALMA

Que meu corpo envelheça.
Que minha alma envelheça.
Envelhecer não é necessariamente caducar.

Não quero alma jovem em corpo velho.
Quero alma velha em corpo velho.
Envelhecer não é obrigatoriamente decrepitude.

Que venha um corpo velho.
Que venha uma alma velha.
Envelhecer não é o mesmo que não saber aprender.

Que minha alma e meu corpo
fiquem enrugados, amassados.
Alma velha também recomeça.

Além do mais, alma tem idade?
Alma envelhece como corpo?
Caso sim, que a minha faça aniversário. 

SOLAR

Acordei antes do Sol, 
que no horizonte já se insinua.
O dia rende, os versos rendem.
O dia vai se fazendo.
Num céu de uma 
limpidez tão azul, 
o dia vai se fazenda. 

ARQUITETURA DOS MINUTOS

Planta baixa: 
falta um quarto 
para que chegues. 

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

DIAGNÓSTICO

— Onde dói?
— Aqui.
— Dói muito?
— Muito.
— Vamos fazer uma radiografia.
— Doutor, mas a alma não vai aparecer, não, vai? 

terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

TÁ RINDO DE QUÊ?

Robert Musil tem um saborosíssimo texto intitulado “Um cavalo sabe rir?”. Musil conta que um psicólogo dissera que “o animal não sabe rir nem sorrir”. Só que ele, Musil, conta que viu um cavalo rindo. O texto é um barato. 

Um trecho: “Ora, um cavalo tem por assim dizer, quatro axilas e, provavelmente, duas vezes mais cócegas que o homem, portanto. Além disso, esse parecia ter também um lugar particularmente sensível, no lado interno da coxa, e toda vez que o tocavam ali, não conseguia conter o riso” (tradução de Nicolino de Simone Neto).

A narradora de “Água viva”, da Clarice Lispector, diz: “Os animais não riem. Embora às vezes o cão ri. Além da boca arfante o sorriso se transmite por olhos tornados brilhantes e mais sensuais, enquanto o rabo abana em alegre perspectiva. Mas gato não ri nunca”.

O gato da narradora de “Água viva” até poderia ser o mesmo a inspirar a crônica “Ode ao gato”, do Artur da Távola: “Nada é mais incômodo para a arrogância humana que o silencioso bastar-se dos gatos. (...) O gato não satisfaz às necessidades doentias de amor. Só às saudáveis”.

Nunca vi um cavalo rindo. Nem um cachorro. Mas eu os concebo rindo. Em contrapartida, não consigo imaginar um gato rindo. Pode ser que ele não seja de rir, mas de sorrir (sorrir implica só o movimento facial; rir implica emissão de som). 

O gato é muito na dele. Parece muito indiferente às contingências humanas, bem como parece nem achar graça disso. Eu acho. Mas eu sou bicho homem. O bicho homem é dos que riem. Eu rio. Às vezes, suponho, como um cavalo. 

EM PAZ

De nada adianta 
o silêncio lá fora 
se não há silêncio 
dentro da gente. 

De nada vale 
a paz lá fora 
se não há paz 
dentro da gente. 

Achar a paz é 
achar o silêncio. 

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

FÁBRICA

Invisto no agora.
Acabo fabricando, 
hoje, a saudade 
de amanhã. 

domingo, 16 de fevereiro de 2014

APONTAMENTO 193

A beleza é versátil: pode ser matemática, verbal, imagética, sonora... Feio é não se dar conta da beleza. 

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

TRAVESSIA

Existe a margem de lá.
Existe a margem de cá.

Vida é o que acontece
enquanto se atravessa o rio. 

DA PONTE



Fotos que fiz num fim de tarde, no dia oito de janeiro de 2007, durante uma das enchentes do Rio Paranaíba. Fácil perceber que a água estava quase chegando à ponte.

terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

FINEZA

CARCARÁS



SINTONIA FINA AO VIVO

Pessoas, a partir das 17h, vou estar ao vivo com o Sintonia Fina, programa musical. Caso queiram escutar, basta clicarem aqui. O programa vai até às 19h. 

À LUZ DE NICOLE


Esta é Nicole, criança que, acompanhando aluna minha no mais recente curso de fotografia que realizei, participava das aulas, com carisma e inteligência. Praticando a teoria ao ar livre, estávamos tirando algumas fotos num fim de tarde, quando me dei conta de que a luz natural que incidia sobre a Nicole estava legal. Tirei, então, a foto. 

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

O MILÉSIMO "GOL" DE TÚLIO

Com muito atraso, somente hoje é que vi o milésimo "gol" marcado por Túlio contra o Mamoré, lá em Araxá. Ora, com um árbitro (Igor Junio Benevenuto) disposto a colaborar daquele modo, estou pensando em começar a jogar futebol e tentar marcar mil gols. O Túlio tem quarenta e quatro anos; é profissional há vinte e sete.

Ele levou vinte e sete anos para fazer mil gols. Todavia, caso eu consiga árbitros tão benevolentes quanto o que inventou aquele pênalti contra o Mamoré, penso que eu chegaria a mil na metade do tempo levado por Túlio. Tenho quarenta e três. Logo, por volta dos cinquenta e sete, eu chegaria ao milésimo gol. Amanhã mesmo vou procurar vaga na URT, time para o qual torço. 

SABIÁ-DO-CAMPO

POEMA 27


Este poema faz parte de um livro meu cuja temática é o amor. O título é Amor de palavra. Para conferi-lo na íntegra, clique aqui.
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O lugar do amor deveria ser em toda parte
Que chato o amor ter de se esconder
O lugar do amor é qualquer lugar

Amor urgente esquece tudo
Na claridade ou sobre o muro
No banco da praça ou no banco de trás
No calor do meio-dia ou no cinema

Amor não tem lugar, não tem hora
Para o amor, servem escadas, mangues, mesas
Amor não planejado não pensa em cama
Amor urgente dá um jeito, se vira
Amor urgente é no chão, no ônibus
Amor urgente se intromete em público
Amor urgente jura que está enganando os pais

Cheiros, línguas, mãos, bocas, sexos
O lugar do amor é quando o amor quer ser feito
O lugar do amor é todo mundo
O lugar do amor é o mundo todo
O lugar do amor é o corpo inteiro 

sábado, 8 de fevereiro de 2014

FAZER BONITO

Nem todo sentimento é bonito.
O que sinto é bonito.
É bonito porque é também palavra.
Nem toda palavra é bonita.
Esta é bonita porque inspirada em ti.
O que sinto é bonito.
É bonito porque tu existes.
Minha palavra é tua.
A beleza é tua.
A beleza é nossa.
Nem todo sentimento é bonito.
O que sinto é bonito porque quero ficar bonito para ti.
É bonito porque te quero bonita. 

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

FOTOPOEMA 346

APONTAMENTO 192

Prefiro os problemas de uma democracia às soluções de uma ditadura. 

NESSIE!

SERVENTIA

Dizem que, 
a rigor, 
a poesia não 
serve para nada. 
Se assim for, 
logo, a rigor,
conforme dizem,
eu me dedico a 
algo que não 
serve para nada. 

A poesia me serve. 
Eu sirvo à poesia. 
Isso me basta. 

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

CAFUNÉ...

Mais um registro antigo com que me deparei ao fazer cópia de segurança de velhos arquivos. Eu nem me lembrava mais de ter tirado esta foto.

PARA O ALTO

Certa vez um fotógrafo, de cujo nome infelizmente não me lembro, escreveu que ao fazer o registro de animais é sempre bom, quando possível, fotografá-los fazendo alguma coisa — alimentando-se, correndo atrás da presa, interagindo entre si... Ainda de acordo com o fotógrafo, no caso de aves e pássaros, é sempre gratificante fotografá-los quando estão voando; para ele, é o que fazem de melhor. Sempre que  fotografo  animais,  lembro--me de que, caso possível, é bom fotografá-los fazendo algo.

Já publiquei outras fotos de aves e pássaros durante o voo; as imagens desta postagem, embora antigas, são parte de cópias de segurança que tenho feito de meus arquivos velhos, que antes estavam somente em DVDs. Aproveito e insiro também fotos do pessoal da Esquadrilha da Fumaça. Afinal, é o animal homem fazendo alguma coisa.



















terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

ALÉM DO HORIZONTE

Fotos tiradas hoje, aqui em Patos de Minas.


O QUE SE DEIXA

Se no chão, é pegada.
Se não, é legado.

Pegada é legado.
Legado é pegada.

Pegadas se apagam.
Legados se extinguem.

Nem por isso deixar de caminhar.
Nem por isso deixar de criar. 

"FAZENDO MOSQUITINHOS"


Segundo minha mãe, eles “estão fazendo mosquitinhos”. Alguém furtou (sic) esta foto quando realizei minha primeira exposição. Numa certa manhã, quando cheguei ao saguão em que a exposição estava sendo realizada, a foto não estava mais lá; na noite anterior, estava. Não sei se o que motivou o furto tenha sido alguma fantasia sexual ou algum fetiche... 

FOTOPOEMA 345

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

NAS ALTURAS


Hoje, mais cedo, eu estava ministrando aula em mais um curso de fotografia. Colocando em prática ao ar livre os conhecimentos adquiridos, a aluna tirava fotos. Foi quando me dei conta do avião. Peguei minha câmera e fiz algumas fotos.

P.S.: segundo meu amigo Cassio, não se trata de um avião, mas, sim, de  um ultraleve avançado FOX. Grato pela informação, Cassio.

ATOR

Aqui,
“sou o
que sou”.
Finjo é
quando
não estou
no palco. 

domingo, 2 de fevereiro de 2014

EINSTEIN E O CACHORRO

Antes de eu dizer o que vou dizer, afirmo: gosto de cachorros. Fui criado numa casa em que havia deles, por causa de meu pai, que sempre os teve. Depois que meu pai morreu a tradição foi mantida. Reitero: gosto de cachorros. 

Recentemente, no Facebook, tem sido veiculada uma foto em que há o Einstein. Junto a ela, a seguinte frase: “Não confio em pessoas que não gostam de cachorro, mas confio totalmente num cachorro quando ele não gosta de uma pessoa”.

Não entendi, para começar, o motivo de haver uma foto do Einstein “ilustrando” a frase. Quiseram com isso, buscando um suposto argumento de autoridade, dizer que o físico é o autor da frase? Isso cheira a autoria incorreta.

Contudo, o curioso é que a frase não faz o menor sentido. Não confiar em uma pessoa pelo fato de ela não gostar de cachorro?! Quer dizer então que o critério para se confiar em alguém é o fato de a pessoa gostar de cachorro? O sujeito pode ser um calhorda, mas se gosta de cachorro é, portanto, confiável? Ou calhordas não são capazes de gostar de cachorro?...

Quer dizer então que todo mundo que gosta de cachorro é confiável? Quer dizer que basta à pessoa gostar de cachorro para que se confie nela? Será que não há alguém nesse mundo de bilhões de pessoas que goste de cachorro e que seja um trapaceiro?...

Ora, isso é limitar a confiança a um critério sem sentido. Hitler gostava de cachorro. Ele gostava de crianças também, e, dizem os biógrafos, não havia nisso traço do que poderíamos chamar de populismo. Pergunte a um judeu se ele confiaria em Hitler após saber que ele gostava de cachorro...

A frase, que já havia começado ruim, terminar pior do que começara: “Confio totalmente num cachorro quando ele não gosta de uma pessoa”. Nesse caso, o critério para se confiar numa pessoa é decidido por um... cachorro. 

E se um cachorro não gostar de sua mãe?... (Será que todos os cachorros do planeta gostam de sua mãe?...) E se um cachorro não gostar de seu melhor amigo?... (Será que todos os cachorros da Terra hão de gostar de seu melhor amigo?...) E se um cachorro não gostar de você?... E se um cachorro vier a não gostar de sua esposa ou de seu marido?...

Um cachorro não vale nem mais nem menos do que um tatu, por exemplo. A diferença é que o cachorro foi domesticado. Séculos e séculos de convivência criaram uma dependência mútua entre cachorro e gente.

Ainda assim, a psique humana é mais melindrosa e multifacetada do que é capaz de deduzir a sagacidade de um cão, por mais sofisticada que ela seja. Não sei se um cachorro se deixa levar pela imaginação, mas o ser humano se deixa, a ponto de dizer que o “parecer” de um cão é critério para se confiar numa pessoa.