terça-feira, 2 de abril de 2019

"Que vocês se explodam!"

Não se pode dizer que não houve aviso. Não me refiro ao que escrevo, ao que publico. Refiro-me ao que a imprensa nacional tem publicado. Não escrevo para avisar, para aconselhar. Escrevo porque gosto de escrever; escrevendo, atendo a essa necessidade. Isso é o que importa. De quebra, se o texto é de teor político, eu me sinto um cidadão melhor, o que também é o bastante para que eu escreva.

Eu tenho escrito, a imprensa nacional — e internacional — tem escrito, tem admoestado, tem avisado, tem dado a dica: em relações internacionais, palavras podem ter um peso desastroso. O representante de um país é capaz de um estrago econômico e humano. A escolha das palavras é importante em toda situação, das mais corriqueiras às mais valiosas. Diplomacia não é terreno para destemperos, para rompantes, para amadores, para os que não têm polidez nem equilíbrio.

“Quero que vocês se explodam”. Foram essas as palavras de Flávio Bolsonaro, publicadas no Twitter, sobre a nota de repúdio publicada ontem pelo Hamas (em postagem anterior, comentei sobre o assunto). A nota de Flávio Bolsonaro foi apagada depois. Claro que o estrago já estava feito.

É direito dele querer que qualquer um se exploda. Só que não é direito dele, no caso em questão, manifestar isso publicamente porque as implicações de uma declaração assim não vão recair somente sobre a vida pessoal dele, com a qual ele faz o que bem entender, mas sobre todo um país. Declarações como essas são graves, podem ter drásticas consequências econômicas.

Quando se representa um país, é dever de qualquer cidadão manter um mínimo de compostura, de tato, de controle. A mais dura das assertivas pode ser dita com a escolha correta das palavras. Prova disso é a própria nota do Hamas divulgada ontem. Justamente pela escolha cuidadosa das palavras é que ela é incisiva. Houvesse alguém escrito “quero que o Brasil se exploda”, isso seria coisa de quem é despreparado e de quem se entrega a rompantes — o que poderia implicar danos econômicos. Diplomacia é terreno melindroso. Cada discurso, casa texto, cada declaração, cada palavra devem ser refletidos, ponderados. Um país não deve pagar pelas bravatas de um inconsequente. A diplomacia é bem mais complexa do que um “que vocês se explodam”.

Qualquer ser humano com algum senso de responsabilidade e com alguma inteligência sabe disso. Só que não se pode deixar de apontar o destempero e as consequências que ele pode ter numa questão tão delicada. Não na esperança de que isso vá mudar o temperamento e a mentalidade do bufão destrambelhado, mas na certeza de que a palavra corretamente aprendida e apreendida é capaz de ajudar na construção de muita coisa, incluindo na de um ser humano.