terça-feira, 27 de março de 2018

Elisa, a polivalente

Fui “censurado” (ou vetado) duas vezes. Este texto é sobre a primeira dessas vezes; a segunda fica para outro apontamento. Na primeira, eu ainda era estudante. Frequentava o Polivalente, onde cursei edificações. Na ocasião, haveria a inauguração de um laboratório que seria útil não lembro mais para qual dos cursos técnicos que havia por lá. Houve toda uma pompa: a banda do 15º BPM esteve presente (lembro-me de que executaram uma canção do Skank), políticos conferiram o evento.

A diretora da escola era Elisa Guedes Duarte. Ela disse que era para um aluno discursar quando da inauguração do laboratório. Como nós, estudantes, havíamos sido informados de que haveria políticos na solenidade, eu, rebelde de corpo inteiro (atitude que tão bem faria — e faz — para mim como adulto), fui cara de pau e sugeri meu próprio nome para o discurso, já pensando no “sermão” que eu daria nos políticos que lá estivessem, não importava quem fossem (eu ainda não sabia quais deles estariam lá).

Feliz da vida, escrevi o discurso. Chegado o dia da inauguração oficial dos laboratórios, a Elisa me pediu para ler o texto que eu havia preparado. Não me opus. Terminada a leitura, ela me pediu que retirasse um trecho, que dizia algo mais ou menos assim: “Se a educação está ruim como está, a culpa, evidentemente, não é dos professores”. Ela argumentou que o momento era de festa e que a ocasião não era ideal para aquela provocação diante dos políticos que estariam no Polivalente. Acatei a ordem dela. Li o discurso, eliminando a crítica.

Houve dicotomia em mim. Por um lado, se minhas palavras haviam sido vetadas, sinal de que minha rebeldia poderia incomodar ou colocar em situação melindrosa os políticos que lá estivessem; isso me deixou muito contente, com a sensação de que eu estava no caminho certo. Por outro lado, ocorreu em mim a impressão de que a Elisa era uma pessoa careta. Na época, não fiz o salutar exercício de me colocar no lugar dela.

Muitos anos depois, eu e ela fomos colegas de trabalho no Unipam. Não lembro mais que cargo ela ocupava (ocupa?) lá. Eu era professor. Saí do Unipam. Mesmo quando eu trabalhava lá, meu contato com ela era raro, profissional; havia breves conversas. Não havia ranço algum de minha parte; nem sei se ela se lembrava de um dia ter me “censurado”. Quando saí do Unipam, os bate-papos entre mim e ela, que já eram poucos, deixaram de existir.

Vieram as redes sociais. Não sei por que paragens anda a Elisa, mas tenho lido as crônicas de autoria dela publicadas no Facebook. Eu não sabia que ela escreve (bem). Há um olhar atento, uma fina ironia, um texto revelador de uma pessoa inteligente, que tem domínio da palavra e que sabe dizer com elegância o que tem para dizer. O adulto em mim, mesmo antes de saber que a Elisa tem talento para escrever, já havia abandonado o vaticínio impetuoso e juvenil de que ela fosse careta; depois de ter me tornado leitor do que ela tem escrito, fico torcendo para que ela mergulhe na arte da crônica. Asseguro que serei leitor. 

O respeito não voltou

O Thiago Silva disse que a camisa da seleção brasileira “merece um pouco mais de respeito”. Sim, mas não por causa da geração dele.