Alguns estarrecidos perguntam-se como apenas um homem, no caso, o presidente, esteja causando tantas mortes devido à não atuação dele para combater a pandemia. Ele não está sozinho e sabe disso. Conta com a tolerância da chamada grande mídia, que é a favor do neoliberalismo do Guedes e caterva. Essa mídia e outras empresas grandes apoiam a retirada de direitos trabalhistas (a reforma da previdência foi uma dessas estratégias).
Há o apoio de empresários muito ricos e o apoio da chamada grande mídia, que é comandada por empresários muitos ricos. De vez em quando, essa mídia finge uma oposiçãozinha. Esse quadro, por si, já praticamente garantiria a solidez da permanência do presidente no cargo. Todavia, não bastassem os apoios dos muito ricos, o presidente tem o apoio dos que não são muito ricos, os quais, por orgulho, crueldade ou burrice, têm aceitado a piora no poder aquisitivo e a tragédia por que passa o Brasil devido à covid.
Que o presidente nunca deu a mínima para a vida alheia, ele mesmo já havia evidenciado isso antes da eleição que o consagrou como chefe do executivo federal; o elogio dele a torturadores já escancara o desprezo que tem pelo outro. A covid seguirá matando e o presidente seguirá indiferente a funestos cortejos. O fato de ele contar com o apoio da população, mesmo ele nada fazendo para proteger a vida dessa mesma população, diz muito não somente sobre o que é o presidente, cuja crueldade e cujo despreparo ele mesmo já espalhava antes de ocupar o cargo em que está agora, mas sobre o país.
É comum ser veiculada a ideia de que o brasileiro é maior do que o bolsonarismo e as atrocidades que ele representa. Balela. Sem generalizações, fácil diagnosticar que, no todo, o brasileiro é cafona, individualista, violento, despreparado, indolente, paroquial, desinformado, ignorante, boçal, arrogante, incômodo, incivilizado, fanático, submisso; não tem senso de coletividade, de cooperação, de empatia.
Se uma pessoa que tomava cloroquina morre por causa da covid, o brasileiro, em vez de escutar a ciência, prefere dizer que essa pessoa morreu lutando, prefere escutar um lunático que lucra com a desinformação. O fracasso do país ao lidar com a pandemia é o fracasso do brasileiro como povo. A morbidez social pela qual estamos passando é consequência não somente da desumanidade de um genocida nem somente da perversidade de grandes corporações, mas do caráter conspurcado e iludido de um povo que não enxerga a si mesmo.
Os valores em que o bolsonarismo se inspirou foram tão bem-sucedidos que a vítima do chicote passou a exigir mais chibatadas. Enquanto a pele vai sendo marcada e o sangue começa a escorrer, a mão pesada aumenta a força dos golpes. Exausto, aquele que apanhou, mal tendo se erguido, já começa a desejar a próxima surra. Para criar a ilusão de que estará recomposto quando ela vier, ingere cloroquina e ivermectina.