João Doria, aquele que mandou retirar, com jatos d’agua, em madrugada fria, mendigos do centro de São Paulo, foi hoje a evento intitulado Marcha para Jesus. Eu não sabia que, além de cidadão de bem, Doria é religioso.
quinta-feira, 31 de maio de 2018
Haicai 68
Não sou homem de fé,
não sei nadar.
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Eu tenho medo de ditadores
A democracia tem seus defeitos, mas o bom dela é que aqueles que não a querem podem dizer abertamente não querê-la. Regimes militares não se inclinam a dar à população essa prerrogativa. A própria ditadura no Brasil provou isso. Em ditaduras, quando se quer dizer que não se concorda com elas, é preciso haver subterfúgios sutis e sofisticados, o que está longe dos nada sutis nem sofisticados métodos que as ditaduras usam para prender, torturar ou matar.
No que diz respeito à economia, à corrupção e à manutenção de privilégios, a ditadura brasileira foi tão incompetente quanto parte dos políticos eleitos durante a democracia. Só que no regime democrático, pode-se dizer que determinado político foi incompetente no exercício de seu trabalho. Ai daqueles que escancararam a burrice, a brutalidade e a ignorância dos ditadores latino-americanos.
Há uns três ou quatro anos escrevi — e agora reitero: prefiro os problemas da democracia às soluções da ditadura. É muita desinformação acreditar que uma ditadura ou um político possa ser redentor, salvador. Há também desinformação quando se alega que o avô ou o pai dizem que no período da ditadura o Brasil era melhor. Pode ter sido melhor ou até indiferente para o seu avô ou para o seu pai, mas isso não quer dizer que tenha sido melhor para o país.
Nasci em 1970. Cresci durante o regime militar. Minha família não passou fome, não foi torturada nem exilada nem morta pela ditadura. Todavia, isso não quer dizer que o país estava saudável. Meus pais não sabiam ao certo o que estava acontecendo. Coube a mim, o que é minha obrigação, procurar me informar sobre o Brasil que era divulgado e o Brasil que era escamoteado durante o regime ditatorial no Brasil.
Li recentemente a autobiografia do imprescindível Jô Soares (segundo ele, haverá um segundo volume de suas memórias). Num trecho, ele comenta do medo que sentiu, durante o regime militar, ao ser levado ao Dops para ser interrogado. De acordo com ele, não o torturaram.
O problema é que há pessoas que defendem a ditadura só porque não tiveram entes torturados. O raciocínio é simplista. De minha parte, asseguro que prefiro viver sem medo de ditadores. No mais, há muito machão metido a corajoso por aí que perderia todo esse furor ao ser torturado numa cela fria e fétida. Eu tenho medo de ditadores.
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