terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

FOTOPOEMA 297


Há muitos anos, no Cine Riviera, cinema local que pegou fogo, assisti a um espetáculo teatral baseado em poemas do Drummond. Foi brilhante. Um pesar eu não me lembrar mais do nome do espetáculo nem do nome da companhia teatral.

Um dos poemas encenados foi o que contém os versos “no meio do caminho tinha pedra / tinha uma pedra no meio do caminho”. Um dos personagens, durante a representação do texto, saía correndo de uma das extremidades do palco e parava súbito no meio.

Assim fez algumas vezes, de modo que a plateia deduzia que ele estava parando a corrida diante de uma pedra criada pela mente. Uma pedra que, a rigor, não estava lá. Precisamente por não estar lá e por ser imaginado pelo personagem, o obstáculo torna-se mais eloquente e opressor.

Enquanto a gente escutava o poema sendo declamado, o personagem voltava, saía correndo outra vez e parava diante da “pedra”, que já estava na cabeça de todos nós. Numa sacada poderosa por parte da trupe, já estávamos todos loucos para tirar a “pedra” do caminho e para saber no que daria aquilo. 

Natural que logo pensássemos: “Será que ele vai superar o ‘obstáculo’?”. Com maestria, o pessoal “colocara” sobre o palco uma pedra-obstáculo, colocada também dentro da cabeça de quem assistia à peça; no fim do poema o ator dá um belo e catártico salto sobre a “pedra”.

Hoje pela manhã, eu me lembrei dessa memorável apresentação teatral. Deixando rolar a reminiscência e o devaneio, que têm um “método” próprio que a gente não sabe decifrar, acabei desembocando, ainda pela manhã, no texto que está junto à foto.

Eu o devo, pois, ao Drummond, ao espetáculo no Riviera e a tantas outras coisas de que nem faço ideia. Meu texto nada tem a ver com a apresentação teatral; além disso, subverte o texto original do poeta.