sexta-feira, 25 de fevereiro de 2022

Cuidado

Cuida de uma criatura. Pode ser um cachorro, um gato, um coelho, um hamster. Cuida de uma criatura. Pessoas são criaturas. 

sábado, 19 de fevereiro de 2022

A história por trás da foto (111)


Antes da chuva de hoje à tarde, a intenção era ir à Lagoa Grande fotografar um casal de amigos numa daquelas chamadas bicicletas de carga. Veio a chuva. Pensei comigo que o ensaio não ocorreria. Quando a garoa deu trégua, fui para a Lagoa Grande. Montei o equipamento. O casal de amigos chegou, mas desistiu de fazer as fotos. Como o equipamento já estava montado, chamei um garoto que estava por perto para que eu o fotografasse na bicicleta dele. O nome do garoto é Artur (não sei se a grafia está correta). Além de topar ser fotografado, o Artur chamou mais dois amigos dele que estavam por perto. A partir daí foi uma farra. Nesta foto, o Artur demonstra que não precisa da bicicleta dele para decolar. 

Fotopoema 423

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2022

Quase castos 2

O flerte vale por si.
Não precisa levar à cama.
Flertar não é prometer.
Leve porque sem expectativas,
o flerte se compraz
no presente do indicativo.

Os afoitos não entendem o flerte.
Os apressados não o apreciam.

O flerte não é convite, não é proposta.
É acontecimento apreciado por aqueles 
que têm as manhas do amor. 

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2022

Assistir para escrever

Já escrevi que valeu a pena aprender inglês, pois assim posso ler a revista The New Yorker, que publicou recentemente texto sobre Caetano Veloso. Se você também é fã do periódico, não deixe de assistir ao filme A crônica francesa, do diretor Wes Anderson. Além de brincadeiras, piscadelas e alusões quanto ao universo da brilhante revista, o trabalho é uma bela reflexão, dentre outras, sobre o ato de escrever. 

Descartes

Na segunda parte de seu Discurso do método, René Descartes (1596-1650) elenca quatro preceitos que seriam os pilares de sua conduta. O primeiro desses preceitos diz o seguinte: “Jamais aceitar algo como verdadeiro sem saber com evidência que seja tal” [1]. Avant la lettre, Descartes ofereceu dica básica de como se precaver contra notícias falsas na era da internet.
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[1] DESCARTES, René. Discurso do método; Meditações. Tradução de Roberto Leal Ferreira. 2ª edição. São Paulo. Martin Claret. 2012. 

domingo, 13 de fevereiro de 2022

A história por trás da foto (110)


Uma coisa é a foto concebida na mente; outra coisa é a foto realizada. Esse princípio vale para qualquer produção. No meu caso, geralmente, a foto realizada está aquém da foto concebida. Isso não significa que a foto realizada não possa estar além da foto concebida. Há ocasiões em que foto ou fotos podem ficar melhores do que aquilo que havia sido imaginado.

Foi o que ocorreu ontem. O Luiz Araújo, comerciante e fotógrafo, havia encomendado uma máscara para que fosse usada em um ensaio fotográfico. Tendo a máscara aspecto sinistro, a ideia era, naturalmente, realizar imagens com atmosfera sinistra. Para isso, o Luiz convidou o Douglas Rodrigues (os dois são amigos) para que ele fosse o modelo.

Além da máscara, para compor o visual, o Luiz me pediu emprestado um blusão verde que tenho. De minha parte, achei melhor pedir ao Douglas que usasse uma capa amarela que também tenho. Além da máscara e da capa, um porrete também comporia o figurino. Decididos esses aspectos, fomos realizar os registros.

Para as fotos que tirei, eu já tinha em mente que usaria flash em todas elas. O flash, além de, nesse ensaio, jogar luz sobre o assunto principal, permitiria que eu subexpusesse o ambiente, por intermédio do manejo de ISO, de abertura e de velocidade. Para que a velocidade da cortina não estivesse acima da velocidade de sincronismo do flash (ou para que estivesse pouco acima da velocidade de sincronismo), usei na lente um filtro ND. 

Observando as fotos ainda no visor, eu já estava gostando dos resultados. Quando comecei a fazer a edição das imagens, fui fazendo os ajustes na intenção de intensificar nelas o caráter sinistro, caráter esse que era, desde o início, minha intenção.

Eu poderia intencionar, mas poderia, seja como for, errar a mão nas capturas das imagens ou na edição. O figurino estava perfeito, de modo que caberia a mim, a partir da composição, das técnicas no momento do clique e da edição, materializar o que estava no pensamento. Os resultados me satisfizeram. Agradeço ao Luiz Araújo, pelo convite para que eu também fizesse algumas fotos, e ao Douglas Rodrigues, pela presteza e paciência durante o ensaio.
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Ficha técnica

Câmera: Canon EOS R
Lente: Canon 50mm 1.8
Flash: Godox AD600BM
Modificador de luz: sombrinha refletora de um metro e vinte de diâmetro. 
Filtro ND acoplado à lente

1/250
F/2.5
ISO 100 

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2022

“Meninos” diante do microfone

O Flow tem o que a maioria dos “podcasts” ou dos canais de “youtubers” têm: pessoas sem preparo, seja em que aspecto for, que fazem piadinhas (sem graça) e usam a informalidade para camuflar a falta de conhecimento. Sem leitura, sem preparo e sem maturidade, investem em tecnologia e em apuro técnico (boa captação de áudio e de vídeo), não se preocupando em cuidar do mais importante: ideias a favor da vida em comunidade e do conhecimento.

Uma das manhas de quem é despreparado é se esconder por trás de um suposto humor e de uma duvidosa informalidade. Ri-se muito, fazem-se muitos gracejos, mas, na maioria das vezes, esses gracejos mais constrangem do que divertem. A razão é que esses bobos inconsequentes não têm estofo, não têm lastro; são uma legião de imaturos. São incapazes de falar seriamente; não entendem que a vida não é feita somente de gracejos imbecis.

Na tentativa de não perder a galinha que dá aos chamados produtores de conteúdo muito ouro, o Flow convidou o professor André Lajst para que ele explicasse o que todo mundo sabe: defender nazismo é defender assassinato, não somente de judeus. A conversa com o professor escancara o que boa parte dos “podcasts” e dos canais de “youtubers” é, mesmo quando feitos por gente que já era famosa em outros meios: diversão de moleques.

O Flow, dentre tantos, nada mais é do que a expressão de uma profunda incapacidade de comprometimento. A internet está cheia de “influencers” que dizem ter o tom e o dom de uma conversa de boteco, mas eles não entendem haver momentos em que a seriedade é o único tom viável, pela simples obviedade de que há assuntos sérios, não entendem que seriedade não implica caretice, não entendem que o boteco pode ser lugar de conversa densa.
 
Esses “meninos” querem ser espirituosos, mas não têm uma gota de carisma nem se preocupam em conquistá-lo, pois já supõem tê-lo; não se preocupam em se (in)formar a partir de sólida trajetória de leitura e de constante preocupação com o ato de aprender. São crescidinhos, bancados por gente poderosa, mas quando diante de um adulto bem (in)formado, revelam a fragilidade de uma criança mimada. 

Haicai sonoro

Cama ao som de Sade.
O corpo toca a cor do céu,
pois o amor é com você. 

terça-feira, 8 de fevereiro de 2022

Não sigo o Fluxo

Monark, do Flow, alegando liberdade de expressão, defendeu a existência de um partido que não admitia liberdade de expressão, de um partido que praticou eugenia, de um partido que executou extermínios. Não é por não saber o que foi o nazismo que Monark defende a existência de nazistas. 

sábado, 5 de fevereiro de 2022

Você está no Tinder?

Felicity Morris é a diretora do documentário O Golpista do Tinder (2022). O enredo já é clássico: mulheres ingênuas caem na lábia de quem finge amá-las, na intenção de obter delas o dinheiro que elas (não) têm. O nome do sujeito é Shimon Hayut. 

Esperto, vai logo dizendo amar as conquistas recentes, ao mesmo tempo em que mostra para elas um modo de vida milionário, com viagens quase diárias em jatinhos particulares, carrões caríssimos, roupas de grife, comida cara e hotéis com piscinas privadas nos quartos. Espertalhão, maneja com esmero as mentiras em redes sociais. Geralmente, o golpe começa no Tinder. 

A ingenuidade das mulheres que foram vítimas do golpista está não em terem acreditado no amor que Shimon Hayut diz sentir e, marota e convincentemente, expressa: a ingenuidade delas está em, após muito pouco tempo, começarem a dar dinheiro para ele e assim continuarem mesmo depois de, por diversas vezes, nada terem recebido como pagamento. Com o dinheiro que ia extorquindo de uma, ele pagava farra para outra(s). 

O mundo embrutece. É louvável quando há pessoas que não perderam a boa-fé. Todavia, quando a boa-fé vem temperada com ingenuidade, a pessoa pode se tornar vítima de salafrários. Sem calçados de proteção, não se recomenda andar em terreno infestado por víboras.

Hayut é esperto. Sabe manipular emoções, corações; conhece a alma feminina. Por isso, tem a manha de, sobretudo, como mentir para as mulheres. As mentiras que ele conta são inverossímeis, atrapalhadas, fantásticas, mas é precisamente de algo fantástico e mirabolante que ele precisa para fazer com que as mulheres deem a ele a grana delas. Ele tem ciência do paradoxo: se a mentira for simples, não convence. Ele tem clara noção de que, para convencer, a mentira tem de ser fantasiosa, tem de ter um enredo. Com outras palavras: Hayut cria uma história, uma ficção, o que prova o poder do ato de contar uma história, o poder da ficção elaborada com maestria.

Hayut domina seu ofício. Sabe que o mundo está cheio de pessoas boas — mas crédulas demais. Uma das entrevistadas, já no fim do documentário, diz que apesar de estar ainda devendo dinheiro a bancos por causa do golpe aplicado pelo espertalhão, ainda acredita no amor. Isso é ótimo. Mas que ela se lembre de um famoso cobrador de impostos, que menciono sem gota de proselitismo, a quem se atribui esta frase: “Sede prudentes como as serpentes e sem malícia como as pombas”.