quinta-feira, 22 de junho de 2017

Apontamento 365

Acredito na inspiração. Não como eflúvios oriundos de fora, mas como manifestações vindas de dentro. Não há mágica nessas manifestações. Do modo como as concebo, são quase orgânicas, corporais. Em mim, elas somente vão existir depois de ter havido a leitura.

Há muito de subconsciente e de inconsciente nessa história. O que leio fica fermentando no cérebro. Enquanto estou distraído ou enquanto pareço não pensar em nada, a fermentação envia resultados. É quando vem um verso, uma palavra, uma ideia. Como não confio em minha memória, anoto o que a fermentação trouxer, seja o que for. Nem sempre a ideia é aproveitada.

Quando não há leitura, não há fermentação. É como se o cérebro ficasse sem o alimento ou sem o combustível de que precisa para se tornar inspirado ou para se tornar capaz de criar algo. Como leio com frequência, o cérebro sente falta quando não tenho oportunidade de ler. Nessa falta, ele nada cria: apenas pede que eu leia. Meu medo não é o de ficar sem ideias, mas de ficar sem leitura. Nunca fiquei sem ideias quando houve leitura. Meus fragmentos se entendem, há lucidez, inteireza.
As coisas podem me inspirar. Um luar, uma mulher, uma paisagem, um bicho podem acender em mim uma ideia. Todavia, sem leitura, não sei o que fazer quando a inspiração vem.

A leitura não me traz somente inspiração (o que já seria muito). Ela ainda faz com que eu me torne mais lúcido, com que minha autoestima não seja tão baixa, com que eu pense melhor. Seria o correlato no cérebro do que ocorre no corpo quando há atividade física. Ademais, o cérebro é corpo, é matéria. A leitura incrementa o que em mim é massa (cinzenta), torna-me mais robusto e mais civilizado. Após leituras, aceito, sem comodismo, minhas imperfeições. Quanto mais leio, mais me conheço.

A leitura não me torna um gênio, não faz nascer em mim o que em mim não tenho. O efeito dela é me colocar mais em acordo comigo mesmo, gerando momentos de tranquilidade, ocasiões em que me aceito e gosto de mim apesar de mim. Ainda que durante turbulência, a inspiração em si é sempre um momento de paz. 

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