Podem ser curiosos os caminhos que um livro percorre até chegar às mãos da gente. Larissa, minha aluna, comprou “Melancia” (Watermelon, Edições BestBolso, tradução de Sônia Coutinho) porque lera incorretamente o nome de Marian Keyes, a autora. Em vez de ler “Marian”, Larissa leu “Miriam”, nome de sua mãe. Foi esse o critério adotado por ela ao comprar o livro.
Em sala de aula, a conversa desembarcou em livros e leituras. Foi então que a Larissa começou a falar muito mal de “Melancia”, dizendo que é um dos piores livros que já havia começado a ler. Ainda de acordo com ela, bastaram algumas páginas para que ela largasse a obra. Ri e quis saber mais sobre “Melancia”, achando o título um barato.
Larissa disse ainda na ocasião que o título se deve ao fato de a narradora estar se sentindo enorme e gorda, tal qual uma... melancia. Achei engraçada a ênfase com que minha aluna falava mal do livro, engraçado o quanto o título era chamativo. Então pedi à Larissa que levasse o livro para mim no dia seguinte, quando voltaríamos a ter aula.
Aleatoriamente, eu o abri. Achei muito festivo um trecho aleatório que li. A seguir, percorri metade da primeira página. Então já era tarde: eu havia sido cativado; teria de ler o livro. Ainda brinquei com a aluna, dizendo que embora eu tivesse lido pouco, havia gostado de cem por cento do que lera.
O livro é muito divertido. É uma leitura leve, fácil e saborosa tal qual... melancia (desconsidere o trocadilho infame). Despojado e bem-humorado, conta a história de Claire, abandonada pelo marido, que vinha tendo um caso com uma vizinha de apartamento.
Bom, mas o que há de divertido numa história de abandono?... Nada. Só que Claire vai narrando seu infortúnio de modo que, paradoxalmente, embora estejamos lendo uma história de muita, muita dor sentida por uma mulher, a gente não deixa de rir.
Ademais, a mão solta (para me valer de uma feliz expressão de Manoel Almeida, advogado e chargista) de Claire, com seu senso de humor, impede que tudo caia num dramalhão piegas, grudento e açucarado demais. Mas, ao mesmo tempo, esse senso de humor, repetido e repetido, quase nos faz esquecer de que há um coração dilacerado. Quase.
O livro é considerado uma comédia. Acho difícil classificar dramas com pitada de humor de comédia. É como o filme “Separados pelo casamento”, que dizem ser comédia. Considero-o drama com doses de humor. No livro de Keyes, a piada vem em maior profusão, mas acho estranho chamá-lo de comédia.
Mas deixem de lado essas teorizações e divirtam-se com “Melancia”. Relevem o excesso de piadas (ou de drama, dependendo de como se veja) e se deixem levar pela cativante Claire, com suas dores, seu saboroso universo feminino, sua família tresloucada e sua imensa capacidade de autoironia.