terça-feira, 21 de janeiro de 2014

"AS SESSÕES"

Sim, assista ao filme “As sessões” [The Sessions], do diretor Ben Lewin, que também é o roteirista. O filme é de 2012; estrelado por Helen Hunt, no papel de Cheryl, John Hawkes, que interpreta Mark O’Brien, e William H. Macy, que faz o padre Brendan.

O filme é baseado em fato real. Para o roteiro, o diretor se valeu também de artigo de Mark O’Brien, intitulado “On Seeing A Sex Surrogate”. O’Brien contraiu poliomielite aos seis anos e teve de passar boa parte de sua vida confinado a um pulmão de aço. Com trinta e seis anos, ainda era virgem.

Tendo sido criado em tradição católica, O’Brien, contudo, tem interesse em perder a virgindade. Embora privado de boa parte dos movimentos, o corpo dele preservara alguma sensibilidade. Ademais, ele tinha ereção. Só que a educação religiosa que havia recebido o deixava com sensação de pecado. É quando procura o padre Brendan, interpretado por William H. Macy.

O padre, por assim dizer, autoriza O’Brien, dando-lhe carta branca para que ele perdesse a virgindade mesmo sem ser casado. É quando entra em cena Cheryl, interpretada por Helen Hunt. Ela era uma terapeuta sexual, mas contratada para lidar com pacientes que tinham sérios problemas sexuais. 

É um filme bonito e engraçado. Em momento algum descamba para o dramalhão, em parte pelo senso de humor de O’Brien, que tem tiradas hilariantes: quando perguntado se ele acreditava em Deus, ele disse que obviamente acreditava, pois era preciso ter alguém para culpar.

O diretor soube dar o tom exato, pois o humor de O’Brien não desemboca em comiseração constrangedora de si mesmo. Ele sabe rir de sua condição, mas não há, contudo, um travo, não há ressentimento. O que há é justamente o contrário: ele quer viver, ele pulsa, ele quer saber o que é o sexo.

Não bastasse tudo isso (o que já não é pouco), há no filme outra questão muito instigante, que é a maneira como as pessoas lidam com os próprios corpos. Graças à ajuda de Cheryl, O’Brien vai tendo uma compreensão maior do que é o seu corpo e dos prazeres que ele pode ter, a despeito do sentimentos de culpa que ele tem e de sua deficiência física.

Um filme adulto, poético, com direção impecável e atuações estupendas de Hunt, Hawkes e Macy. Alguém disse (Borges?) que é inútil, senão impossível, separar o corpo da alma. Enquanto eu assistia ao filme, eu me lembrei dessa frase. O debilitado corpo pode ser fonte de felicidade.

Como dito acima, o roteiro de Lewin é baseado na vida de Mark O’Brien e no artigo dele cujo título também está acima. O’Brien também escreveu versos. Alguns poemas dele podem ser lidos aqui. Já o artigo em que também se baseou o roteiro do filme está disponível aqui.

Embarcando no clima, li o artigo do O’Brien em que o filme se baseou. Recomendo. Percebe-se pelo artigo que diretor e produtores respeitaram a essência da personalidade do cinebiografado. Tomam liberdades, mas elas não deturpam nem o humor nem o tom do que ele escreveu. Vale dizer por fim que o filme tem algo que também está no artigo de O'Brien: a benéfica desmistificação (não a banalização) do sexo.