quarta-feira, 1 de setembro de 2010

DEZOITO ANOS DEPOIS



Antes de tudo, penso que a leitura deve ser um ato generoso, fraterno. A leitura conclama a uma irmandade atemporal. Eu leio, tu lês, aquele outro leu há milênios. Somos uma comunidade de leitores.

Ler de modo generoso não significa ler sem espírito crítico. Significa ler sem soberba.

Os primeiros textos que publiquei em livro saíram numa coletânea intitulada “Cem anos de literatura e um século de poesia”, lançada em 1992. Na obra, textos de escritores locais. Dois textos meus estão presentes.

Contudo, não saíram como os escrevi. Assim que tive o livro em mãos e me deparei com as modificações, fiquei decepcionado, e achei uma falta de respeito eu não ter sido consultado quanto às mudanças.

No lançamento da obra, não investiguei quem havia realizado as modificações em meus textos; acabei esquecendo o assunto. Até o dia em que, tempos depois, numa de tantas madrugadas antigas, num dos bares da cidade, o “crítico” comentou comigo que havia sido ele o responsável pelas alterações.

Perguntei a ele o motivo das mudanças; a resposta me pareceu nada convincente: “Achei que ficaria melhor”. Mas antes mesmo que eu tentasse entender melhor o pensamento dele, veio isto: “Leio Borges e logo penso em modificações que melhorariam o texto”.

Depois disso, vi que era bobagem argumentar. Não que Borges não possa ter momentos ruins; não que eu não tenha momentos ruins (dois desses momentos podem estar no “Cem anos de literatura e um século de poesia”).

Está muito longe do espírito fraterno da leitura alguém que modifica um texto literário sem antes dialogar com o autor, alguém que fica “melhorando” textos alheios. Alguém assim está perto da cabotinice.

Posteriormente, por conta própria, eu lançaria dois livros; eu quis publicar novamente os textos modificados tais como haviam sido escritos por mim. Entretanto, eu me esqueci. Assim, abaixo, as duas versões dos dois textos. Primeiro, o texto na visão do “crítico”; depois, o texto como havia sido escrito por mim.
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Brancas sensações

brancas sensações me invadem.
sem a paixão que corrói,
sem a depressão que destrói,
me invadem brancas sensações.

sou todo otimismo, planos e namoro.
o otimismo e suas implicações,
os planos e suas implicações,
o namoro e suas implicações,
o saber viver e suas implicações.

o tempo é de sorriso,
tranqüilidade no coração,
progressos oceânicos,
ampla evolução.

se meu país se tornar mais feliz,
sei que me tornarei mais feliz então.
um contentamento vasto
preenche minha vida,
enche meu peito.

respiro bem fundo, aspirando energia.
tenho prazer em aspirar, expirar, ousar.
imenso prazer em aprender,
imenso prazer em viver.

afinal, brancas sensações me invadem.

quero a sua amizade,
o meu sorriso,
a alegria daquele outro.

quero minha juventude;
que venha minha velhice.
quero brancas sensações a me consumir.
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São 23h30.
Brancas sensações me invadem.
Sem a paixão que corrói,
sem a depressão que destrói,
me invadem brancas sensações.

Sou todo otimismo, planos e namoro.
O otimismo e suas implicações,
os planos e suas implicações,
o namoro e suas implicações,
o saber viver e suas implicações.

O tempo é de sorriso,
tranqüilidade no coração,
progressos oceânicos,
ampla evolução.

Se meu país se tornar mais feliz,
sei que me tornarei mais feliz então.
Um contentamento vasto
preenche minha vida,
enche meu peito.

Respiro bem fundo, aspirando energia.
Tenho prazer em aspirar, expirar, ousar.
Imenso prazer em aprender,
imenso prazer em viver.

Afinal, brancas sensações me invadem.

Quero a sua amizade,
o meu sorriso,
a alegria daquele outro.

Quero minha juventude;
que venha minha velhice.
Quero brancas sensações a me consumir.
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Elucubrações osculares

sobre o beijo, uma pequena divagação:
concreto é o ato em si,
abstratas as sensações que provoca.
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Sobre o beijo, uma pequena divagação:
concreto é o ato em si,
abstratas as sensações que provoca.