Se vivêssemos num país, Bolsonaro e Moro teriam de prestar contas à justiça, depois das declarações dadas por este mais cedo. Sabe-se que nada disso vai ocorrer. Moro chegou a dizer que o presidente trocou o comando da PF para ter acesso a investigações e a relatórios da entidade, o que não é permitido pela legislação. No fim das contas, sabemos que nem Moro nem Bolsonaro nem seus filhos terão de explicar alguma coisa.
Moro interferiu nas eleições, já sabia, antes mesmo delas, das ligações da família Bolsonaro com milícias, já sabia dos elogios a torturas... Uma vez como ministro, fingiu não saber de Queiroz, fingiu não saber da milícia digital perpetrada por um dos filhos de Bolsonaro, fingiu não saber dos inúmeros delitos do presidente (já mencionados por mim em outro texto). Não era preciso ser gênio para saber que Bolsonaro seria um desastre como mandatário. Mesmo assim, Moro embarcou. Ainda que não seja candidato a presidente nas próximas eleições presidenciais, saiu-se bem ao deixar o cargo de ministro.
A maioria da população não levará em conta que ele é um dos responsáveis pelo engodo e pela ascensão do bolsonarismo, pois essa mesma maioria é pró-Moro exatamente por isso. Em lance bem jogado, desvencilha-se, pelo menos por enquanto, do que Bolsonaro representa. A noção de tempo é perfeita: a saída de Moro não soa precipitada nem dá a entender que veio tarde. Os mentores dele sabem o que fazem.
Se Moro for candidato a presidente, conta, desde já, com o apoio dos demais cínicos (agora dizem terem se arrependido do voto para presidente), que fingiram não saber o tipo de gente que Bolsonaro é. Moro é um desses cínicos, mas não é bobo. Espertalhão, sendo ou não sendo candidato a presidente, saiu como o bom mocinho da história, o que ele nunca foi.