terça-feira, 7 de abril de 2015

SOBRE OS REBELDES

A expressão “rebelde inteligente”, do modo como encaro a rebeldia, é redundante. O espírito rebelde, tal qual o concebo, é sagaz, não destrutivo. A rebeldia constrói ideias, instiga, inspira, entusiasma.

O verdadeiro rebelde quer o bem comum. Para quem não sabe entendê-lo, o rebelde é visto como mero arruaceiro, desses que tolamente saem por aí fazendo tolas pichações. Nada mais distante de um rebelde do que um arruaceiro.

O verdadeiro rebelde luta por conquistas coletivas. Nessa sua luta, pode se enganar, é claro, mas ele não se predispõe a enganar os demais. Pode ser visto como encrenqueiro ou como individualista. Com frequência, é banido, mas as coisas pelas quais luta são atemporais.

O verdadeiro rebelde incomoda os conservadores por quebrar a pasmaceira, por questionar, por ter noção de seus direitos e por cumprir os deveres. Por natureza ou em essência, o rebelde é um idealista, um sonhador, um utópico. Suas atitudes são consequência desse espírito.

O sonhador incomoda por mexer no estado em que as coisas se encontram. O que para ele é simples afirmação pode ser visto como balbúrdia por aqueles que têm interesse em conservar o astral como ele está. O mundo melhora graças aos rebeldes, não graças aos que estão interessados mais em si mesmos do que na evolução de uma coletividade.

O rebelde professa, quer ensinar, quer mostrar, quer contar. Ele quer dizer a todos sobre uma outra possibilidade; uma possibilidade livre, menos pesada, menos opressora. Ele se cansa, ele desiste; contudo, para apoquentação de muitos, o rebelde volta. Se não em pessoa, voltam suas ideias, as quais, a rigor, nunca vão embora.

O rebelde incomoda quando age. Sua beleza é tal que ele continua incomodando mesmo depois de ter ido embora. Às vezes, mesmo sem intenção, o rebelde desestrutura, agita, faz vibrar.

O rebelde sabe que nunca terá a seu lado os mais poderosos. Mas ele não anseia pelas bênçãos de quem está no poder. O rebelde se sente à vontade é com aqueles que não têm oportunidade para se manifestarem. Ou que não se manifestam por temerem retaliações.

Poderosos caretas não entendem a beleza da rebeldia. No entanto, reconhecem o perigo que pode haver num grupo quando nele há um rebelde. Sempre haverá um não conformado sendo proscrito. Por um lado, isso é ruim; por outro, se sempre há um rebelde sendo exilado, sinal de que a pujança da rebeldia não nos abandona.

O rebelde não seduz os preconceituosos; é desprezado pelos que, por migalhas ou por carros, bajulam os poderosos; pode causar inveja nos que morrem de vontade de ser como ele. Ainda que sem querer, o rebelde perturba. Por isso mesmo, não raro, é espezinhado.

Os inteligentes não ressentidos, os de mente aberta, ainda que não concordem com alguma ideia dos rebeldes, nem por isso deixam de constatar: os rebeldes são mais do que necessários — eles são encantadores. 

DO TRIBUTO A PAUL WALKER

Alguém escreveu que “morrer é dobrar a esquina”. Sempre tive comigo que essa frase é do Guimarães Rosa, mas não estou certo disso. Ontem, ela me ocorreu novamente. Explico por quê.

Não assisti a nenhum dos filmes da franquia “Velozes e furiosos”. Independentemente disso, é claro, fiquei sabendo da morte do Paul Walker; ontem, fiquei sabendo do tributo que há para ele no mais recente filme da série.

Assim que conferi o tributo no Youtube, a frase entre aspas do primeiro parágrafo me veio à mente. É que a homenagem a Paul Walker acaba sendo uma materialização ou concretização do conteúdo que citei.

A sequência que homenageia Walker, a qual se valeu de computação gráfica, é bonita e eficaz. Tanto que nem é preciso ter assistido aos filmes da série para que ela seja compreendida, para que se tenha noção do que é sugerido.

O João Cabral costumava dizer que palavras concretas são mais úteis para a poesia do que as abstratas. Nesse pensamento, a palavra “cadeira”, por exemplo, seria mais eficiente para a linguagem poética do que, por exemplo, a palavra “solidão”.

Talvez por isso eu goste de “morrer é dobrar a esquina”. “Esquina” é um elemento concreto, palpável. Talvez por isso eu tenha gostado da sequência que homenageia Paul Walker. Afinal, talvez, a morte seja tomar outro caminho. Sendo ou não, tal sugestão é bonita.