Recentemente, a Carina Fragozo, responsável, no YouTube, pelo canal English in Brazil, publicou um vídeo em que ela menciona cinco canções que são escolhidas com frequência para serem executadas em casamentos porque parecem românticas. Todavia, esse suposto romantismo estaria nos arranjos, mas não nas letras. Dentre essas canções, Carina menciona, por exemplo, “More than words”, da banda Extreme.
O vídeo dela me fez lembrar de que aqui em Patos de Minas, é comum os noivos pedirem que “Hallelujah”, a clássica canção do Leonard Cohen, seja executada em cerimônias de casamento. É claro que o casal tem direito de escolher a canção que bem entender. Mesmo assim, tenho a impressão de que parte desses casais não pediriam a execução de “Hallelujah” durante seus casamentos se conhecessem o teor do que é cantado. Ainda no terreno das impressões, outra que tenho é a de que os noivos, talvez, deixem-se guiar pela melodia e pelo pequeno coral. Reunidos — o título da canção, a melodia, o coral e o arranjo — confeririam uma atmosfera “sagrada” ao aleluia de Leonard Cohen.
Abaixo, tradução da letra. Levei em conta o original gravado pelo compositor canadense. Ele mesmo canta uma versão estendida do texto num show gravado em Londres. Essa versão estendida poderia “redimir” a letra original, para que ela soasse “apropriada” numa cerimônia de casamento. Mesmo assim, ou seja, mesmo levando-se em conta a versão gravada ao vivo em Londres, estão presentes os originais versos “problemáticos” para serem cantados durante um casamento. Não bastasse isso, essa versão tem os seguintes versos:
Bem, talvez haja um Deus lá em cima
Quanto a mim, tudo o que aprendi do amor
É como atirar em alguém que sacou a arma mais rápido do que você
Mas não é um crime você estar aqui hoje à noite
Não é algum peregrino que alegue ter visto a Luz
Não, é um frio e um muito sofrido Aleluia
Agradeço aos músicos Edgar Medeiros e César Braga em virtude das pacientes explicações que me deram quanto ao trecho da letra que faz referências à nomenclatura e às características dos acordes mencionados nos versos da canção. Sem as ajudas do Edgar e do César, eu teria um painel menos vasto do esmero de Cohen. Eis, pois, a tradução, em consonância com a gravação original de “Hallelujah”:
Agora ouvi dizer que havia um acorde secreto
Que Davi tocava e que agradava ao Senhor [1]
Mas você realmente não se importa com música, não é?
É assim, o quarto, o quinto
O menor desce, o maior sobe
O perplexo rei compondo Aleluia [2]
Sua fé era forte, mas você precisava de prova
Você a viu se banhando no telhado
A beleza dela e o luar sobrepujaram você
Ela amarrou você a uma cadeira da cozinha
E ela destruiu seu trono e cortou seu cabelo
E dos seus lábios ela fez sair o Aleluia [3]
Você diz que levei o nome em vão
Eu nem sei o nome
Mas se eu soubesse, numa boa, o que é isso para você?
Há um clarão de luz em cada palavra
Não importa qual você tenha ouvido
O Aleluia sagrado ou o sofrido
Eu fiz o meu melhor, isso não foi muito
Eu não conseguia sentir, então tentei tocar
Eu falei a verdade, eu não vim para enganar você
E embora tudo tenha dado errado
Ficarei diante do Senhor da Canção
Com nada em minha língua a não ser Aleluia
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[1] O Davi da estrofe é o do antigo testamento. Segundo o relato bíblico, ele gostava de dançar e de compor elegias.
[2] A segunda metade da primeira estrofe é metalinguística: os versos descrevem o que está ocorrendo nos acordes e em seus graus na harmonia da canção.
[3] A segunda estrofe faz alusão a duas histórias bíblicas. Os três primeiros versos envolvem Davi, Betsabeia e o marido dela, Urias. Davi a vê tomar banho, manda buscá-la, ela engravida dele. Não assumindo a paternidade e livrando a barra de Betsabeia, Davi arquiteta para que Urias morra durante uma batalha. Os três últimos versos envolvem Sansão e Dalila, que, depois de insistências, o convenceu a contar para ela qual era o segredo da descomunal força dele. Tendo por fim obtido a resposta, Dalila, mediante pagamento, entrega Sansão aos inimigos dele.