segunda-feira, 1 de abril de 2019

Era uma vez a diplomacia

Mais trapalhadas da diplomacia brasileira. Dessa vez, por causa da visita a Israel. O colunista Josias de Souza, do UOL, elenca o que ele chamou de três gols — contra: a não transferência da embaixada brasileira de Tel Aviv para Jerusalém desagradou a Israel; o que vai haver em Jerusalém é um escritório de representação comercial (primeiro gol contra); os palestinos, mesmo cientes da não abertura da embaixada em Jerusalém, condenaram a abertura do escritório comercial e chamaram de volta Ibrahim Alzeben, o embaixador no Brasil. Consequências na prática: prejuízos para o agronegócio, pois os árabes podem passar a comprar de outros (segundo gol contra); por fim, o governo brasileiro já tem um escritório comercial em Ramallah, que fica a quinze quilômetros de... Jerusalém. Não há a necessidade de mais um escritório comercial na região (terceiro gol contra).

Foi isso o que noticiou Josias de Souza em seu blogue. A lambança já seria o bastante fosse só isso. Só que em diplomacia as consequências são internacionais, não ficam restritas ao quintal de casa. O Hamas, movimento de resistência islâmica, publicou hoje em seu site nota de repúdio contra a visita do governo brasileiro a Israel. O Hamas pede recuo quanto à abertura do escritório em Jerusalém, ao mesmo tempo evidenciando que as jogadas da diplomacia brasileira na recente visita ameaçam os laços com nações árabes e islâmicas.

Em sanha de negar conquistas de governos anteriores, a diplomacia brasileira (e o governo como um todo) pode jogar por terra o que o Itamaraty construiu. Estou lendo Quem manda no mundo? [Who rules the world?], do Noam Chomsky, publicado em 2016. Sobre a questão Israel-Palestina, ele escreve: “Negociações sérias teriam que ocorrer sob os auspícios de alguma parte neutra, de preferência uma parte que imponha algum respeito internacional — talvez o Brasil” [1].

A diplomacia brasileira, até recentemente, gozava de prestígio. Agora, é achincalhada. A revista Jacobin, em matéria publicada em 26 de fevereiro, chamou Ernesto Araújo de “o pior diplomata do mundo”, já condenando, no lide, a patética subserviência do governo brasileiro ao governo trumpista. Estou curioso para ler outra matéria, esta, publicada na piauí deste mês, intitulada “O anti-iluminista”: Consuelo Dieguez faz o perfil de Araújo. A chamada de capa: “Ernesto Araújo, o chanceler brasileiro que idolatra Donald Trump”. 
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[1] Chomsky, Noam. Quem manda no mundo? Tradução de Renato Marques. 1ª edição. São Paulo. Planeta. 2017. Pág. 102. 

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