Não é fácil criar música que tenha a intenção de manter tradições populares. Empresários não investem nesses trabalhos, as rádios não os executam e boa parte da nova geração, que pouco se vale do rádio para escutar música, em suas redes sociais ou dispositivos eletrônicos, tem acompanhado o que anda sendo feito no que a mídia convencionou chamar de sertanejo universitário.
Num contexto assim, é louvável que Luiz Salgado invista numa vertente que, antes de ser música, tem um papel social importante, que é o de não abrir mão de tradições. Elas compõem aquilo de que somos feitos. Negá-las é negligenciar um manancial poderoso e poético. Conhecer aquilo que é nossa substância não implica fechar os olhos para o que vem de fora, para o novo, para o outro.
“Quanto mais meus óio chora, mais o mar quebra na praia” é o mais recente (o quinto) CD de Luiz Salgado; o trabalho tem quinze faixas. Não há corte radical no CD se comparado aos demais já lançados por Luiz Salgado. Todavia, de modo mais intenso, o artista se mostra capaz de promover uma gostosa mistura entre elementos caipiras e sonoridades atuais.
Estão presentes no CD a religiosidade interiorana, o cerrado, o canto triste do sertanejo, a folia de reis, a temática social, a viola. Um dos grandes méritos de “Quanto mais meus óio chora, mais o mar quebra na praia” é ter conseguido fazer com que esses elementos não soem datados (de fato, não são), mas evidenciar que têm muito a dizer sobre o que somos.
Em contrapartida, os robustos arranjos imprimem nas canções uma profunda sintonia com o que há de mais, digamos, urbano, contemporâneo. O trabalho é tradição; ao mesmo tempo, soa atual. Há mistura de gêneros, de influências, sem que o todo pareça saturado. Tradição sem ressentimento, modernidade sem concessões mercadológicas.
Nessa amálgama feita do que é antigo e do que é novo, o trabalho tem viola caipira e solo de guitarra. É um CD lírico, um cântico às tradições que abraça com bela alma musical os recursos atuais. Luiz Salgado está tradicional como sempre, atualizado como nunca.
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