sexta-feira, 29 de agosto de 2014

A BOCA DE PATRÍCIA MOREIRA

Patrícia Moreira, a torcedora do Grêmio que, ontem, xingou o Aranha, goleiro do Santos, de macaco, foi afastada de suas atividades no Centro Médico Odontológico da Brigada Militar. Patrícia é auxiliar de saúde bucal. O episódio pode resultar em punição para o Grêmio; a fim de evitá-la, o time já identificou dez torcedores que também foram racistas durante o jogo. Dois dos torcedores eram sócios do clube; foram excluídos, segundo o Grêmio. Os outros oito não poderão mais assistir a jogos do time quando ele jogar em casa. Segundo Aranha, ele também foi chamado de “preto fedido”. 

Sempre que fico sabendo desse tipo de xingamento, eu me lembro de uma frase que diz: “Um gambá cheira o outro e acha que é perfume”. Patrícia, bem como quem xingou o goleiro de “preto fedido” e aqueles que ficaram imitando macacos no jogo de ontem, acham-se, suponho, cheirosos — ou pelo menos acham que o Aranha fede. A Patrícia, o Aranha, você e eu podemos feder ou cheirar bem. Essas questões biológicas e simples parecem não fazer parte do pensamento de Patrícia e afins.

A torcedora do Grêmio e os similares dela que estavam ontem no estádio não devem ter lido “Viagens de Gulliver”, do Jonathan Swift. Se leram, podem ter passado pelo livro como quem está diante de um manual de instalação de suporte de televisor. No livro, Swift relativiza culturas, relativiza nossos cheiros, para afinal fazer concluir que somos feitos de uma mesma matéria — que pode não cheirar tão bem como gostaríamos que cheirasse. Por fim, é irônico: ao ser filmada pela ESPN, Patrícia, auxiliar de saúde bucal, mostrou que o que sai da boca dela não é nada limpo. 

2 comentários:

Hellen Dirley disse...

...Aprecio muitíssimo ler a sensatez com a qual escreves, meu amigo Lívio

Lívio Soares de Medeiros disse...

Muito obrigado pelas leituras, Hellen.