sábado, 1 de janeiro de 2022

A Filha Perdida

Forçoso dizer logo de cara que nada li da Elena Ferrante a não ser os textos (crônicas?) que ela publicou no jornal The Guardian. Sim, isso significa conhecer parte minúscula da obra dela. Mesmo assim, esse quase nada é brilhante. É que o filme A Filha Perdida é baseado num dos livros de Elena Ferrante. A diretora e roteirista é Maggie Gyllenhaal (a atuação dela em Secretária, do diretor Steven Shainberg, a partir de um conto de Mary Gaitskill, é estupenda).
 
Em A Filha Perdida, Leda, interpretada por Olivia Colman, está em férias numa praia grega. Lá, ela tem contato com uma família que logo, logo faz com que ela, Leda, se lembre da família que teve. Em saltos temporais que ora mostram o desenrolar da vida de Leda enquanto ela curte as férias, ora colocam em cena o passado dela, o enredo vai se desenvolvendo.

Eu queria simpatizar com Leda. Ou, melhor dizendo, eu queria entendê-la. Terminado o filme, com ela não simpatizei, não a entendi. E isso é ótimo — a pior coisa que pode acontecer para quem cria um personagem é esse personagem ser insosso, esquecível. Não há como ser indiferente a Leda.

O filme de Maggie Gyllenhaal lida com a temática do casamento e os cansaços a que ele pode levar. Mas, há mais: a produção não tem medo de abordar as agruras da maternidade. Dito com outras simples palavras, a questão de que a pessoa pode não estar pronta para ou pode não querer ser mãe/pai. 

Leda não queria mesmo ser mãe ou não estava pronta para ser mãe? Não importa se isto ou aquilo. Independentemente da resposta, por que o passado tanto a atormenta? Por que ela tanto lamenta a mãe que foi? A pergunta nos leva, aparentemente, a deduzir a mãe que ela gostaria de ter sido. Mas será que ela gostaria mesmo de ter sido a mãe que deduzimos que ela gostaria de ter sido?... Não sei.

Do que sei, é que A Filha Perdida suscita questões demais. Sugere-se algo “apodrecido” em Leda (as frutas podres sobre a mesa, a minhoca (?) que sai de dentro da boneca). Por outro lado, leva-se em conta haver uma jovem com esplendor intelectual e com um potencial gigantesco tendo de cuidar das filhas pequenas e de conviver com um marido que não a satisfazia sexualmente.

Conhecendo a Leda do passado, queremos entender a Leda do presente. Ou, pelo menos, queremos, vá lá, justificar a Leda do presente. Nada disso se conclui (não bastasse, o filme de Maggie Gyllenhaal tem o mérito de evidenciar que Dakota Johnson não se resume à patuscada que é Cinquenta Tons de Cinza). À medida que A Filha Perdida ia se desdobrando, ora eu pensava “esse filme é ruim, mas é bom”, ora eu pensava “esse filme é bom, mas é ruim”. Iniciados os créditos, pensei: “Esse filme é uma obra-prima”. 

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