O que me levou a assistir a “Grandes olhos” (2014) não foi a obra de Margaret Keane nem sua (no mínimo, curiosa) biografia. Eu quis assistir ao filme porque ele é dirigido pelo Tim Burton; os roteiristas são Scott Alexander e Larry Karaszewski. A não ser pelo bairro citadino retratado logo no começo do filme, “Grandes olhos”, disponível na Netflix, não tem o design de produção típico, algo fantástico e mágico dos filmes de Burton, o que não torna a película um trabalho menor do diretor.
Logo no começo, ficamos sabendo da proposta de Walter Keane (Christoph Waltz), marido de Margaret (Amy Adams): ela pintaria os quadros, mas ele fingiria ser o autor das obras, alegando que sem o tino comercial dele e sem o talento marqueteiro que ele tinha, as pinturas não venderiam. Walter, de fato, torna as criações da esposa uma fábrica de dinheiro.
O filme é curioso não somente pela história em si, mas também pelo fato de nos deixar com alguns questionamentos: o que é arte? o que é necessário ocorrer para que um trabalho seja considerado arte? quem decide o que é arte? a chamada grande arte pode ser comercial, enlatada? qual o poder do marketing naquilo que é considerado arte?... Dito assim, parece haver um excesso de questões a serem discutidas. Todavia, o tom do filme não é o de discutir tais questões, mas expô-las. Quem fica remoendo essas ideias depois que o filme termina é o espectador. Não bastasse, “Grandes olhos” é um retrato do que foi o mundo dos artistas descolados em meados do século, com seus experimentos, suas liberdades e seu... marketing...
Nós, cientes do quanto Walter Keane é um picareta, quase sentimos pela dele. No fundo, ele quer ser um artista, quer viver o mundo badalado da fama, usufruir as conquistas materiais que o dinheiro traz. Só não temos pela dele porque ele é um enganador, mas um enganador, pelo menos como retratado no filme, com um ponta de delírio ou de loucura. Ficamos sem saber se ele só age em nome da pilantragem ou também em nome do não conformismo com sua falta de talento para a pintura. Ele é um brilhante profissional do marketing, mas não é um artista.
(Para quem gosta de curiosidades: aos doze minutos e quarenta segundos, uma senhora pode ser vista ao fundo, sentada num banco, com um livro em mãos; ela é a Margaret Keane real. Amy Adams, que a interpreta, é a atual Lois Lane; num determinado momento do filme, entra em cena John Canaday, um crítico de arte do jornal The New York Times. Repare que Canaday é interpretado por Terence Stamp, que fez o general Zod nos clássicos filmes do Super-Homem com o Christopher Reeve na década de 80.)
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