domingo, 19 de fevereiro de 2017

Festa da empresa

Quantos são?
Quarenta?
Cinquenta?
Não importa.
Cada um é mais do que o bastante,
mais do que não sabe.

Há risos, piadas, olhares, rusgas encobertas.
Observo os rostos, os gestos, os caminhares,
a fumaça do churrasco, a música, os corpos que, 
por enquanto tímidos (ainda não houve álcool o bastante),
querem se libertar: o chefe não está,
e se estivesse, não seria para dar ordens,
ainda que seja o que ele queira (ele sempre quer).

É só a festa da empresa.
Iguais a tantas que ocorrem neste momento
e a todas que já ocorreram.
As quarenta ou cinquenta pessoas são um todo.
Parecem felizes, predispostas à pândega.

Eu escrutino cada um.
Aquele ali ri alto, mas está apreensivo,
pois não sabe se a namorada vai perdoá-lo.
Aquele acabou de chegar com a esposa e com os filhos;
não se cogita que ele preferiria estar em casa descansando.
Aquela outra chegou com o marido e com o filho;
não se supõe que ela gostaria de estar com o amante.
Outro casal vai pegar chope;
não se sabe o quanto estão bem um com o outro.
Mais adiante, lá no canto, o que veste camisa azul
não suporta mais o jeito mandão e asséptico da esposa.
Aquela outra se sabe conservadora, mas queria ser diferente.
Aquele outro pensa que precisa deixar o comodismo de lado.
O rapaz de preto se aproxima da chefe pensando em seduzi-la.
Ninguém sabe da paixão que a moça de vermelho nutre pelo
colega de trabalho, que está usando  bermuda e camiseta.
Esquadrinho os outros, sabendo-me esquadrinhado. 

A festa prossegue.
Ao mesmo tempo em que é um grupo,
com suas leis físicas e pessoais,
é feita de pessoalidades,
com suas leis físicas e pessoais.
Mistura do todo com o que é cada um,
a festa se move, se embebeda, 
revela-se, abraça-se, beija-se,
num misto de faz de conta,
confissões e desejos, que,
neste momento da festa,
já são menos velados. 

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