O que mais me chama a atenção quando escuto o trabalho de Piêit é a capacidade que ele tem, a partir de suas canções, de criar um clima. Num sentido amplo, toda canção tem, por assim dizer, seu clima. Do modo como encaro o trabalho de Piêit, o clima não é a consequência dos arranjos ou da letra, mas o ponto a partir do qual algo será composto; a impressão com que fico é a de que o clima é que é, antes de tudo, buscado. Letras e arranjos seriam, nesse modo como encaro o EP “Azul” (lançado em janeiro deste ano), “pretextos” para se chegar a um determinado clima.
No que diz respeito à sonoridade, é nítida em “Azul” a influência de algo do pop dançante e eletrônico e de muito do rock, em especial uma vertente do rock com tons mais soturnos, como o feito pelo Radiohead ou mesmo pelo Coldplay, levando-se em conta os trabalhos anteriores a “Viva la vida or death and all his friends”. As letras de “Azul”, reflexivas, fazem jus ao clima intimista que permeia o EP, a despeito dos momentos em que o som fica um pouco mais pesado.
Intérprete de timbre grave e de recorrentes falsetes, Piêit imprime nas letras das canções um tom peculiar e bastante pessoal. Não se rendendo a modismos disseminados em programas de competição televisivos, em que se tenta reproduzir no português a escola americana de canto, Piêit confere individualidade ao que canta. Desnecessário dizer que isso é muito bem-vindo. Já conferi apresentações do artista em que ele foi acompanhado apenas por um violão; em momentos assim, a capacidade de interpretação de Piêit parece falar ainda mais alto.
A página pessoal do cantor no Facebook anuncia turnê para breve. Se você ainda não conhece o trabalho, escute “Azul”, bem como o primeiro EP do artista, “Demasiado”, lançado em agosto de 2014. E se tiver a oportunidade, confira algum dos shows da turnê que virá e que já foi anunciada, embora ainda não tenham sido divulgados nem locais nem datas. Piêit compõe o profícuo momento da música vivido na cena local de algum tempo para cá, em que os artistas estão investindo em canções autorais. A exemplo dos demais intérpretes e instrumentistas daqui com trabalhos próprios, Piêit tem uma linguagem profundamente contemporânea, o que o livra de bairrismos bobos.
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