A ideia de que o cidadão tem de fazer justiça por conta própria está em voga. Constatando a incapacidade do Estado em oferecer segurança, alguns cidadãos decidem que estão aptos a punir aqueles que transgridem a lei.
A incapacidade do Estado não implica a capacidade do cidadão. Ademais, quando o dito cidadão de bem, essa entidade abstrata, decide julgar, acaba defendendo a pena de morte, entoando mantras como “bandido bom é bandido morto”.
É o cidadão se julgar superior às instituições e superior a outros cidadãos. Julgando-se assim, sente-se no direito de tirar a vida de outra pessoa, igualando-se, assim, aos contraventores. Imaginemos um cenário em que as instituições sejam substituídas pelos chamados cidadãos de bem. Num contexto assim, eu teria ainda mais medo do que o que já tenho.
O argumento do dito cidadão de bem é este: “Se está com dó de bandido, leve pra sua casa”. Ou então: “Quero ver você defender bandido quando a vítima for você”. Ora, eu já sou vítima; eu vivo me policiando. Sempre digo que só temo uma única coisa neste mundo: gente. Eu também sei o que é viver com medo.
É curioso: o chamado cidadão de bem, ao se arvorar no direito de fazer justiça, é truculento. Esse cidadão denomina-se como sendo do bem, mas ele é violento. Se não em gestos, no discurso. E, suponho, ao olhar para os próprios delitos, grandes ou pequenos, não os vê como dignos de punição.
Num “sistema” tão arbitrário, em que bastaria a um grupo qualquer se achar apto a fazer justiça, imagino que muita gente inocente seria considerada culpada, pois com grupos agindo por conta própria não é dada ao “réu” a chance de se defender. Ter-se-ia então uma situação sinistra: a justiça não puniria os contraventores, e inocentes poderiam ser punidos por grupos de “justiceiros”.
Aos desavisados, penso não ser preciso dizer que não defendi contraventores nem disse que o Estado esteja cumprindo com eficácia o que é obrigação dele. Apenas não quero uma sociedade em que gente que se diz de bem seja a responsável por minha “segurança”.
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