quarta-feira, 28 de novembro de 2012

BONECAS

Crianças de um a setenta e cinco anos faziam a festa no tradicional almoço de domingo. As mais velhas falavam e se divertiam com assuntos diversos na varanda. As mais novas se pulverizavam no restante da casa.

Foi quando uma delas voltou para a varanda. Era uma garota de dois anos, com a vivacidade que a idade lhes confere. Tinha consigo uma boneca, a qual era quase do tamanho da menina, que se atrapalhava um pouco ao carregá-la, embora conseguisse realizar a tarefa.

Os mais velhos ficavam perguntando para a garota o nome da boneca, quem era o namorado dela e coisas afins. Quando um deles fez menção de que a tomaria da criança, ela se afastou correndo. Na fuga, a boneca caiu. Foi quando uma das tias disse:

— Lorena, larga essa boneca pra lá. Deixa ela no chão. Ainda mais esse trem feio, preto. Boneca preta. Aff...

A menina não deu bola para o que disse a tia, pegou a boneca no chão e foi mostrá-la para outra de suas tias, que embarcou no clima da criança e brincou com as duas, ora fingindo que ia tomar o brinquedo da menina, ora beijando ambas.

Parecendo já enfastiada dos beijos, Lorena, mantendo a posse da boneca, foi procurar outros ares. Enquanto cruzava a varanda, a tia que sugerira que ela deixasse a diversão entrou em cena novamente. Segurou a mão da criança, interrompendo o trajeto dela, e disse:

— Lorena, deixa a boneca pra lá. Você é tão bonita. Ela é preta, é feia. Joga ela fora.

Lorena:

— Fora?

— É. Jogar fora, pra longe — as palavras foram reforçadas com gestos amplos.

A garota parecia intrigada. Tinha cara de quem não entendia muito bem o que estava acontecendo. Com expressão curiosa, olhava para a tia e para a boneca. Desistindo de qualquer tentativa de compreensão, deixou de conversa com a tia e saiu, levando consigo a boneca.

2 comentários:

Murillo disse...

Lívio, para mim, um dos seus melhores textos! Bravíssimo! Forte abraço!

Lívio Soares de Medeiros disse...

Olá, Murillo. Valeu mesmo. Obrigado.