Adão, quarenta e dois anos, comprou a passagem. O ônibus embarcaria às 22h15. Sua poltrona era a de número quatro. No veículo, Arlete, uma jovem de vinte e cinco, estava sentada na três – com os pés na quatro. Adão colocou sua mala no compartimento acima das poltronas e olhou para a jovem. Ela deu um levíssimo sorriso, arredou os pés e Adão se sentou.
Segundos depois, Arlete se levanta e passa para o outro lado do corredor do ônibus, ocupando a poltrona de número um – com os pés sobre a dois. Adão pensou que logo ela teria de voltar para o lugar dela, pois ele tinha quase certeza de que o passageiro da poltrona um estava prestes a surgir. É que no guichê Adão chegara a pedir a poltrona três e depois a um. Ambas já haviam sido vendidas.
Minutos depois, duas mulheres entram no ônibus. Uma delas, Ana Maria, de trinta e sete, carregava Clara, bebê de três anos. A outra, Isoleta, de setenta e dois, uma pequena sacola vermelha. Ana Maria foi para a parte de trás do ônibus. Isoleta havia comprado passagem para a poltrona um, que estava ocupada por Arlete.
Antes de se sentar, a senhora olhou para as poltronas um e três. Leu pausadamente para si mesma: "Pol-tro-na um". Quando a jovem já ia se levantar a fim de voltar para seu lugar, Isoleta conversou com Adão:
– Se você não se importar, eu queria ficar na sua poltrona. Fico enjoada se viajar no canto.
Adão achou estranho esse negócio de ficar enjoada somente quando se viaja no canto. Contudo, ficou sem jeito de dizer não; cedeu o lugar para a senhora. Enquanto mexiam os corpos no pequeno espaço, Isoleta quase caiu. Justificou-se:
– Às vezes caio; é por causa da minha coluna.
Isoleta se alojou na poltrona quatro. Só que Adão teria de ir para o lugar destinado a ela, que era a poltrona um, onde estava Arlete. Esta esboçou novamente o leve sorriso de há pouco. Tirou os pés da poltrona dois e se encolheu no canto. Adão ocupou a dois. Se alguém chegasse para ocupá-la, Adão teria de ir para a três, o que não ocorreu. Arlete não voltaria para a três, seu lugar de origem. Minutos depois, a viagem teria início.
Durante o percurso, Isoleta, pequena que é, deitou-se sobre as duas poltronas, com a cabeça virada para a janela; dormiu e roncou. De vez em quando, num sacolejo maior, um de seus pés chegava a esbarrar na perna de Adão, esticada para fora, ocupando parte do corredor. Incomodado pelo ronco de Isoleta, Adão não dormiu nada durante a viagem de sete horas.
No desembarque, enquanto se afastava do ônibus, Adão pôde ouvir Isoleta, toda risonha, comentar com Ana Maria:
– Inventei uma balela qualquer pros dois que estavam lá na frente; acabei ficando com duas poltronas só pra mim...
Segundos depois, Arlete se levanta e passa para o outro lado do corredor do ônibus, ocupando a poltrona de número um – com os pés sobre a dois. Adão pensou que logo ela teria de voltar para o lugar dela, pois ele tinha quase certeza de que o passageiro da poltrona um estava prestes a surgir. É que no guichê Adão chegara a pedir a poltrona três e depois a um. Ambas já haviam sido vendidas.
Minutos depois, duas mulheres entram no ônibus. Uma delas, Ana Maria, de trinta e sete, carregava Clara, bebê de três anos. A outra, Isoleta, de setenta e dois, uma pequena sacola vermelha. Ana Maria foi para a parte de trás do ônibus. Isoleta havia comprado passagem para a poltrona um, que estava ocupada por Arlete.
Antes de se sentar, a senhora olhou para as poltronas um e três. Leu pausadamente para si mesma: "Pol-tro-na um". Quando a jovem já ia se levantar a fim de voltar para seu lugar, Isoleta conversou com Adão:
– Se você não se importar, eu queria ficar na sua poltrona. Fico enjoada se viajar no canto.
Adão achou estranho esse negócio de ficar enjoada somente quando se viaja no canto. Contudo, ficou sem jeito de dizer não; cedeu o lugar para a senhora. Enquanto mexiam os corpos no pequeno espaço, Isoleta quase caiu. Justificou-se:
– Às vezes caio; é por causa da minha coluna.
Isoleta se alojou na poltrona quatro. Só que Adão teria de ir para o lugar destinado a ela, que era a poltrona um, onde estava Arlete. Esta esboçou novamente o leve sorriso de há pouco. Tirou os pés da poltrona dois e se encolheu no canto. Adão ocupou a dois. Se alguém chegasse para ocupá-la, Adão teria de ir para a três, o que não ocorreu. Arlete não voltaria para a três, seu lugar de origem. Minutos depois, a viagem teria início.
Durante o percurso, Isoleta, pequena que é, deitou-se sobre as duas poltronas, com a cabeça virada para a janela; dormiu e roncou. De vez em quando, num sacolejo maior, um de seus pés chegava a esbarrar na perna de Adão, esticada para fora, ocupando parte do corredor. Incomodado pelo ronco de Isoleta, Adão não dormiu nada durante a viagem de sete horas.
No desembarque, enquanto se afastava do ônibus, Adão pôde ouvir Isoleta, toda risonha, comentar com Ana Maria:
– Inventei uma balela qualquer pros dois que estavam lá na frente; acabei ficando com duas poltronas só pra mim...
7 comentários:
É... parece mesmo que a gente faz sim, as coisas serem como têm de ser.
Caro busólogo, estou fazendo um desenho para tentar entender a dança das poltronas. Afinal, os números ímpares são janelas e pares o corredor?? "Canto" é janela? :-)
Caro Manoel, como busólogo que sou, e na tentativa de usar o mínimo de palavras, posso ter dificultado, muito sem querer, a leitura.
Sim, os números ímpares são janelas. Usei "canto" devido à divisória que os ônibus têm para separar passageiros do motorista. Por causa dessas divisórias, cantos (do lado esquerdo e do lado direito) são formados juntos às quatro poltronas da frente.
Caso a dúvida persista, diga e tento eu mesmo fazer o "desenho"...
Abraço.
Prezado Lívio, muito obrigado pelos esclarecimentos. Seu texto está muito bem escrito, como sempre. Ocorre que eu pensava que "canto" era janela, daí a confusão. Confesso ainda que não entendi o motivo de você (ops!), digo, o "ADÃO", TER de ocupar a poltrona dois. Ele não poderia também optar pela três, independentemente da chegada de outro pasageiro? Abraços fraternos!
Manoel, a senhora, deitada, ocupou poltronas três e quatro. E ainda que isso não tivesse ocorrido, a poltrona três pertencia originalmente a Arlete.
Abraço.
Ok, Lívio. É que antes não há menção ao fato de que a senhora ocuparia ambas, mas apenas que "Isoleta se alojou na poltrona quatro". Pelo que entendi, ela apenas se deitou porque Adão abandona a três, correto?
Não. Adão deixou a poltrona quatro vazia. E Arlete já deixara a três.
Abraço.
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