quarta-feira, 22 de novembro de 2017

Meu balanço da Fliaraxá

À parte uma excessiva e artificial intimidade dirigida aos convidados por parte do mediador da maioria das conversas nos diálogos literários na Fliaraxá, que ocorreu de quinze a dezenove de novembro, um evento como esse é bom por um sem-número de razões. A questão dessa intimidade me incomodou porque era reiterada. Não há nada de errado em alguém expressar carinho ou afeto por um amigo em público. Todavia, quando há o exagero, a conversa cai num tom informal demais, fazendo com que o evento assuma uma leveza afetada.

Não é da conta de ninguém se o mediador é muito amigo dos convidados. É muito antipático quando a pessoa quer mostrar, reiteradamente, que é amigo de alguém num evento em que há um imenso público que não está interessado na amizade que possam ter, mas, sim, no trabalho que executam. Talvez o auge de tudo isso, que considero pouco profissional, tenha sido o momento em que o mediador chamou Zuenir Ventura de Zuzu. Tivesse isso sido um episódio isolado, teria sido algo que até poderia ter soado divertido, mas foi apenas mais um ato da longa série de intimidades ou supostas intimidades entre amigos no tom de que se valeu o principal mediador das conversas.

Não bastasse, ao expor a (suposta) amizade que tem com os convidados, o mediador, que também foi o curador do Fliaraxá, se valia de um tom muito baixo de voz, na intenção, suponho, de soar carinhoso para os amigos. Nessas horas, era quase impossível escutá-lo, mesmo eu tendo estado o tempo todo muito perto do palco e das caixas de som. A curadoria dele foi excelente; nomes consagrados se juntaram a estreantes, autores de variados matizes participaram. Penso que seria melhor a Fliaraxá manter a curadoria e buscar outro mediador para as conversas.

Dito assim, sei que estou parecendo um daqueles velhos ranzinzas que reclamam de tudo. Asseguro que sou apenas velho. As reclamações que faço são muito mais expressão de um desejo genuíno que o evento dê certo, que prossiga, que cresça. Além do mais, o que considero intimidade forçada e falta de profissionalismo pode não ter incomodado outras pessoas e pode não ser encarado assim por outros que acompanharam a Fliaraxá, seja pessoalmente, seja via internet.

No todo, gostei demais do evento, que é um refrigério em meio a tanta caretice que tem havido no Brasil. Sei muito bem que não é fácil organizar algo daquele porte. Há muita gente e muito equipamento envolvido. As coisas funcionaram. Os imprevistos que aconteceram não comprometeram o andamento da festa. É bom presenciar uma cidade do interior, com pouco mais de cem mil habitantes, possibilitando a nós, sem cobrar entrada, acesso a grandes nomes da literatura nacional (Cristovão Tezza, Luiz Ruffato) e internacional (Mia Couto, José Luís Peixoto).

Pela primeira vez, a Fliaraxá foi realizada no famoso Grande Hotel de Araxá, espaço amplo e bonito para um evento que foi tão amplo e bonito quanto o lugar em que ocorreu. Não houve tolices, não houve ninguém pedindo tortura nem ditadura, o que é um alento num país em que livres manifestações de ideias têm sido invadidas por quem não quer pensamentos contrários aos seus sendo debatidos. Só num evento assim é que temos a oportunidade de estarmos próximos daqueles que tanto admiramos à distância. Voltei de Araxá já com saudade do que houve e com vontade de estar lá outra vez. 

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