sábado, 14 de março de 2015

AV. JK, EM PATOS DE MINAS


Revendo arquivos, eu me deparei com esta foto, tirada em dezenove de fevereiro de 2012. Eu preferiria uma imagem, digamos, laica, em que não houvesse o dizer religioso na placa, já que minha intenção era buscar uma temática urbana, não religiosa. 

 Seria fácil apagar a placa em programa de edição. Todavia, isso não faria muito sentido, considerando-se a temática urbana com que eu estava em mente. Afinal, tendências, paradoxos, ideologias, fios e desafios estão no caldeirão urbano. 
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F/16.0 
30 segundos 
ISO 100 

ASDRÚBAL, OS NÚMEROS, AS PALAVRAS

Os números vistos e entrevistos todos os dias, as palavras lidas inteiramente ou as vistas de relance. Para Asdrúbal, todos os números e todas as palavras com que nos deparamos fazem parte de uma linguagem cifrada em que o destino de cada um está escrito. Cada indivíduo, todos os dias, lê, em números e em palavras com que se depara, o destino que é seu.

Asdrúbal acreditava que se decifrasse como funciona o código que é só dele, poderia, então, compartilhar a técnica com a humanidade. Por cinquenta e três anos, dedicou-se a anotar milhões de números e palavras. Compôs em seus cadernos esquemas e diagramas em que se perdia. Sentia-se acossado pelo material com que lidava. Cismou de que a compreensão de sua vida viria a partir do número 2007 e da palavra “entusiasmo”.

Num dia de frêmito, quando estava, para si, no limiar da solução que vinha buscando há décadas, ouviu por um rádio que ficava na casa do vizinho o locutor dizendo: “São 20h07! Cheios de entusiasmo começamos mais uma noite de muita música!”. Asdrúbal interpretou a fala do locutor como um sinal de que a pesquisa estava no caminho certo. Redobrou o ânimo, acirrou os esforços. Mal dormia, mal se encontrava com pessoas. Enfurnou-se mais ainda no cômodo que escolhera para realizar com sossego seu trabalho.

Quando sua irmã estava recolhendo os cadernos com as anotações de Asdrúbal, pensou na inutilidade de tudo aquilo. Folheou de modo aleatório alguns deles. Tentou extrair sentido do que lia. Sentiu um misto de graça, de ternura e de saudade numa frase escrita por Asdrúbal: “Locutor confirma que estou certo”. A princípio, quis guardar as anotações. Depois, acabou ateando fogo em tudo. Enquanto os papéis se dobravam sobre si mesmos à medida que as chamas os consumiam, perguntou-se se o corpo de Asdrúbal teria se dobrado sobre si durante a cremação.