sábado, 28 de maio de 2016

Um velho velho

Se eu for velho, que eu seja um velho com cabeça de velho. Não quero ser um velho com cabeça de jovem. Não compro essa ideia de que o que importa não é a idade cronológica, mas a idade do espírito. Que meu espírito tenha a idade de meu corpo — nem mais nem menos. Se um dia eu chegar a ter, digamos, noventa e um anos, que eu tenha cabeça de noventa e um anos.

Parece-me que aqueles os quais dizem não querer que a cabeça envelheça têm medo de ser tornarem caretas, como se a velhice trouxesse necessariamente a caretice. Têm medo de não acompanhar tendências, medo de ficar para trás. Pode haver velhice com lucidez, com informação, com leituras. A velhice pode ser atualizada.

Envelhecer pode fazer com que uma pessoa fique retrógrada. Contudo, o velho retrógrado, na maioria dos casos, foi retrógrado a vida toda, ainda que com menos intensidade. Geralmente, não é a velhice que traz comportamento obsoleto. Tal comportamento pode vir a ocorrer na velhice; contudo, isso não implica dizer que tornar-se velho seja o mesmo que se tornar antiquado.

Basta um velho ter bom humor ou ser espirituoso ou entender novas atitudes sociais para se dizer que ele tem espírito jovem. Senso de humor ou compreensão de vanguardas, sejam elas quais forem, nada têm a ver com a suposta idade do espírito. Isso está ligado a uma postura e a um temperamento sedimentados ao longo de toda uma vida. 

Velho usando roupa de velho e pensando como velho não implica obrigatoriamente ser datado nem anacrônico. Anacrônico é velho pensar como jovem. Velhice não é pasmaceira. Há inquietude em qualquer idade; se eu ficar velho, que eu tenha inquietudes de velho, não as de um homem de vinte e cinco anos. Há entusiasmo em qualquer idade; se eu ficar velho, que eu tenha entusiasmos de velho, não os de um jovem de dezoito.

A velhice pode ser elegante, pode ter brilho mental. Se eu tiver saúde e lucidez razoáveis, que eu me vista como velho, que eu pense como velho, que eu converse como velho se velho ficar. O culto exagerado da juventude e da aparência incutiu nas pessoas o pensamento de que ser velho é se vestir de modo feio, é cheirar mal, é ser ultrapassado. Compreender e descartar as bobagens do presente não é o mesmo que ser careta. 

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