quinta-feira, 28 de abril de 2016

O amor que se vai

 “Algo tão bom não poderia acabar”. Mas acabou. O que há agora é uma espécie de inconformismo, alimentado por uma esperança que se nega a aceitar o rumo que as coisas tomaram. Quando um amor acaba, ele acaba fora da gente. Dentro, fica a esperança, que se recusa a aceitar o fim de algo que era tão bom, de algo que dava tão certo. Não bastasse esse inconformismo, a dificuldade em refazer a vida, nos seus mais banais instantes. Já não há mais alguém com quem compartilhar o texto lido, já não há uma pessoa a quem desejar “bom-dia”, já não há mais a companhia para o cinema, não há mais aquela pessoa para quem se embelezar.

Por um lado, a rotina pode enferrujar uma relação. Por outro, o amor se alimenta de pequenas e gostosas repetições. Não há amor sem rotina. Se você não consegue deixar de encarar a palavra “rotina” como sendo pejorativa, pense que não há amor sem hábito (se você não consegue deixar de encarar a palavra “hábito” como sendo pejorativa, pense que não há amor sem rotina).

Por um lado, o amor requer criatividade, invenções, surpresas; por outro, carece de repetições, de reiterações, de previsibilidades. Saber o que repetir e saber como criar robustecem um amor. Quando um amor acaba, vão-se embora aquelas saborosas repetições e aquelas rejuvenescedoras possibilidades de invenções. Quando um amor termina, lamenta-se também a chance que tínhamos de sermos criativos, espirituosos.

A partir daí, um carro que passa, uma rua, uma palavra, sinos que dobram, a foto de um rinoceronte, uma piada tola, a marca de um chocolate ou o comentário casual de uma tia sobre o estado do tempo: é como se o mundo conspirasse para que não consigamos tirar a pessoa do pensamento. Mas, no fundo, sabemos que o mundo não conspira; sabemos que é o amor que faz com que o objeto amado esteja em tudo.

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